Acer corrige o rumo

O presidente mundial da companhia taiwanesa, Jim Wong, confirma à DINHEIRO que vai iniciar a produção de computadores de mesa no Brasil em 2012.

No fim de novembro, o discreto executivo Jim Wong entrou na sala de conferências do nono andar da sede da empresa taiwanesa de computadores Acer, num moderno distrito empresarial de Taipei, capital de Taiwan, para uma entrevista coletiva. Em pé diante de jornalistas de 11 países, desfilou os fatos notáveis da companhia que na última década comprou concorrentes, fez do netbook um sucesso global e se tornou a segunda maior fabricante mundial de PCs. Para concluir, mostrou novidades criadas para manter a marca entre os grandes da indústria. Mas as novas máquinas não conseguiram esconder o fato de que 2011 é um ano para a Acer esquecer. A companhia, que no ano anterior capitaneava o sucesso da indústria de tecnologia da pequena ilha na costa da China, se viu traída pelo excesso de otimismo. “Acreditamos que a crise não reduziria tanto a demanda, nem que os tablets teriam tanto impacto nas vendas de nossos PCs”, disse Wong. O mea-culpa de Wong faz sentido. Desde abril, quando se tornou presidente corporativo da Acer, Wong lida com um mercado que se mostra impiedoso com os recentes equívocos estratégicos da empresa.

O principal deles – uma estimativa irreal da demanda mundial – levou a fabricante a inundar o varejo com notebooks e PCs, sobretudo na estagnada Europa, que responde por 40% das vendas da marca. “Se o lojista tem estoque para muitos meses, por que continuaria a comprar da gente?”, afirmou Wong. Sem compradores, o encalhe – e as perdas – foram inevitáveis. Neste ano, a Acer registrou os primeiros prejuízos de sua história: US$ 226 milhões e US$ 43 milhões, respectivamente no segundo e terceiro trimestres. Mais de US$ 150 milhões foram gastos para manejar os estoques da Europa para mercados com melhor demanda. Em meio ao rearranjo, a projeção das vendas foi reduzida em 50% e a empresa, que encerrou 2010 como a segunda maior fabricante de PCs do mundo, perdeu terreno e deve fechar este ano na quarta posição.
 
A receita da Acer para reconquistar terreno passa por uma mudança profunda no tipo de consumidor que os produtos da marca tentarão seduzir. Dos netbooks e notebooks com atributos padronizados, mas com preços para lá de competitivos, a futura geração de produtos preza pelo desempenho e design, entre outros atributos. “É uma mudança enorme de paradigma: privilegiar valor em detrimento do melhor custo”, diz Wong. Em vez dos netbooks de US$ 200, notebooks bem finos, como o seu Ultrabook S3 Aspire, de US$ 899, o primeiro concorrente do badalado McBook Air, da Apple, e já à venda no Brasil. Para analistas do setor, a estratégia põe a Acer na rota certa, mas também na mesma toada de suas principais rivais.
 
“Chegou o momento em que se reduziu tanto o preço que as margens tornaram os computadores um péssimo negócio”, afirma Ivair Rodrigues, diretor de pesquisa da IT Data, empresa especializada no setor de tecnologia. “Agora, as empresas buscam diferenciais.” Nas novas investidas, uma das principais cartas na manga da Acer interessa diretamente ao Brasil. Trata-se, aliás, de uma seara bastante familiar para Wong, que começou na empresa em 1986 na divisão latino-americana. Com os mercados americano e europeu estagnados, a saída para a Acer será investir nos mercados emergentes. Wong disse à DINHEIRO que isso inclui, em 2012, a importação de smartphones e a produção de desktops em uma de suas duas fábricas no País, onde a marca oscila entre o segundo e o terceiro lugares nas vendas de notebooks, atrás de HP e Dell.

“Não posso dar mais detalhes sobre isso”, afirma Wong. É certo, porém, que as expectativas são altas. Segundo ele, as vendas da Acer no mercado nacional dobraram em relação a 2010, quando a companhia retomou a produção local após uma ausência de seis anos. Parte da estratégia de mudança passa pelo reconhecimento público dos erros cometidos nos últimos anos. Em uma hora de conversa, Wong não se furtou a identificar as decisões equivocadas. Uma delas foi ter considerado o segmento de tablets uma “moda passageira”, conforme afirmou há algum tempo o fundador da empresa, Stan Shih. A miopia foi corrigida e posteriormente esse setor foi alvo de tratamento especial. Seu tablet Iconia Tab A500, que tem recebido elogios dos especialistas, será o primeiro concorrente do iPad a ser dotado com processadores QuadCore da Intel, versão mais potente que os atuais DualCore.
 
O lançamento do Iconia ainda é mantido em sigilo, mas é a aposta da Acer para reverter um ano frustrante de vendas. A empresa havia projetado a comercialização de cinco milhões de tablets, estimativa reduzida para 2,5 milhões devido à fraca procura. Com uma linha renovada de tablets, PCs, notebooks, ultrabooks e smartphones, a Acer pretende armar o bote contra o domínio da Apple e seu mais novo projeto, o iCloud, serviço de computação por servidores remotos da empresa da maçã. Batizado de Acer Cloud, a nuvem da empresa taiwanesa permitirá aos usuários de produtos da marca acessar e compartilhar dados de qualquer dispositivo pela internet. Ainda não há data para o lançamento, mas o primeiro passo já foi dado.
 
Em julho, a marca de Taiwan comprou por US$ 320 milhões a americana IGWare. Baseada no Vale do Silício, berço da indústria de alta tecnologia, essa startup é a responsável pelo recurso de computação remota disponível pelos consoles da japonesa Nintendo. Assim, a Acer entra no mercado que é considerado a próxima fronteira da computação. O setor de computação em nuvem, segundo a consultoria Gartner, movimentou US$ 74,3 bilhões em 2010 e deve gerar US$ 128,9 bilhões daqui a dois anos. “Uma companhia de PCs 100% dependente de computadores não sobreviverá mais que dez anos”, afirma Wong.

(Guilherme Quieroz l Isto É Dinheiro)

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