Águas Claras é novo Eldorado imobiliário

A 20 quilômetros de Brasília, Águas Claras transformou-se no novo Eldorado da construção civil e um paraíso para empreiteiras de todo o país, com o metro quadrado chegando a R$ 5,5 mil para imóveis residenciais e R$ 6,5 mil para os comerciais
Quando Brasília foi projetada pelo arquiteto Lúcio Costa, a ideia era que em cada ponto da cidade – formada a partir do esboço de dois traços em forma de cruz e do desenho de um avião – se pudesse avistar a linha do horizonte. A topografia plana do cerrado e a arquitetura milimetricamente projetada com construções baixas garantiriam essa sensação. Até que, há cerca de dez anos, começou a surgir uma mancha no horizonte. Tímida, a princípio, tornou-se maior e mais insistente a cada ano. Povoada por espigões, cada vez mais juntos e mais altos, Águas Claras se destaca na árida paisagem do Distrito Federal.

A apenas 20 quilômetros da Capital Federal, é o novo Eldorado da construção civil. Sem restrições regulatórias rígidas, como Brasília, tornou-se paraíso para empreiteiras. O preço do metro quadrado quintuplicou em seis anos – varia entre R$ 4,5 mil e R$ 5,5 mil no residencial e chega a R$ 6,5 mil no comercial – e a expectativa é que ainda tenha espaço para subir mais. No começo da cidade, a terra custava tão pouco que era mais barato comprar um terreno maior e fazer um estacionamento aberto do que construir garagens subterrâneas. Hoje, os prédios novos costumam ter até três subsolos.

Nos últimos anos, Águas Claras se auto-intitulou o maior canteiro de obras da América Latina – ou, para quem prefere uma dose adicional de charme, a Abu Dhabi brasileira. Sem números comparativos, o que se pode afirmar, de fato, é que nenhuma outra cidade brasileira foi erguida tão rapidamente. Em 2004, não havia mais do que 80 prédios em Águas Claras. Hoje, são cerca de 600 edifícios prontos e quase 200 em construção. A cidade é empoeirada e barulhenta de tanta obra.

Como Brasília, Águas Claras é uma cidade projetada. As semelhanças terminam aí – o ar seco também é o mesmo. Nada mais. As ruas são estreitas, há poucas árvores e os prédios são altos e coloridos. Não obedecem nenhum padrão e ficam bem próximos um dos outros. A maioria tem mais de vinte andares e ampla área de lazer no térreo. Como nas grandes cidades, a janela pode dar para a parede ou a sacada do vizinho. Mas Águas Claras também não se parece com uma cidade convencional. Não tem casas. Boa parte do comércio fica em pequenas galerias debaixo dos prédios residenciais.

Cerca de 70% já foi ou está em construção. Praticamente não há mais terrenos nas mãos do governo. Os quadriláteros vazios que restam entre os prédios – sem tapumes, o que coloca o chão de terra batida vermelha ainda em mais evidência – pertencem à iniciativa privada. "Os donos estão sentados em cima dos terrenos esperando valorizar ainda mais", afirma Lincoln Marino Xavier, superintendente de aquisição de terrenos da Brookfield no Distrito Federal.

 
Inicialmente, foram as construtoras locais – Via Empreendimentos, JC Gontijo e Villela Carvalho – que começaram a fazer projetos na região (veja história da cidade no texto abaixo). Há cerca de quatro anos começaram a chegar as empresas "forasteiras", construtoras nacionais – muitas delas de capital aberto – para aproveitar a evolução crescente do metro quadrado. Hoje, Brookfield, MRV, Rossi, Inpar e Tecnisa estão na região. O fato de permitir construções com o mesmo padrão de outras cidades brasileiras foi um fator preponderante para abrir as portas para as empresas de fora. É também o que, muitas vezes, atrai quem chega para morar em Brasília – além do preço, claro.

A expansão de Águas Claras está diretamente ligada ao contexto imobiliário de Brasília. O preço do metro quadrado dentro do Plano Piloto é o mais caro do Brasil. O Setor Noroeste, que começou a ser licitado no ano passado após mais de vinte anos sem novas construções no Distrito Federal, teve um terreno de mil metros quadrados vendido por R$ 22 milhões. O preço final dos apartamentos está sendo comercializado entre R$ 8 mil e R$ 12 mil o metro quadrado. "Hoje o preço de Águas Claras está cerca de 50% abaixo do Plano Piloto. Vai ficar, no máximo, 30%", diz Paulo Muniz, diretor da Ademi/DF. O trânsito, porém, para chegar à região já é um problema.

A Brookfield, que acabou tendo uma posição privilegiada na região após a aquisição da MB Engenharia – empresa focada no Centro-Oeste, está fazendo o maior lançamento da cidade. Em um terreno de 60 mil metros quadrados, irá construir um projeto de R$ 480 milhões de VGV (valor geral de vendas), com três torres residenciais com serviços – ao antigo flat – duas comerciais e um shopping de tamanho médio. O terreno também irá abrigar a sede do Wal-Mart. "É um mercado muito promissor, com espaço para novos conceitos", diz Luiz Rogélio Tolosa, diretor financeiro da Brookfield.

Não por acaso, o empreendimento chama-se DF Century Plaza, como o empreendimento da construtora em uma esquina nobre do Itaim, em São Paulo. O projeto foi apresentado ao mercado com uma mistura de luxo e tecnologia – ambientes sensoriais, cadastro em IPad, telão de 52 polegadas sensível ao toque e sete ambientes luxuosamente decorados. Foram gastos mais de R$ 3 milhões no lançamento. Tudo para aumentar o valor agregado da região e conseguir vender a até R$ 6,5 mil o metro quadrado

A região atraiu até a MRV, empresa focada na baixa renda – mercado que não existe em Águas Claras, cujo preço do terreno não comporta Minha Casa, Minha Vida. "Foi uma questão de oportunidade", diz José Lima Melo, responsável pela região. A empresa tem quatro empreendimentos no bairro . Chegou a vender 1,1 mil unidades em menos de quatro meses. A Rossi entrou na região em dezembro passado e vendeu apartamentos de 34 metros quadrados a R$ 180 mil em apenas 15 dias. "É uma das velocidades de vendas mais altas do mercado", diz Frederico Kessler, da Rossi de Brasilia.

(Sergio Dutti | Valor )
 
 

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