Ano deve abrir em ritmo intenso nas captações locais

O início do ano deve ser bastante ativo no mercado de renda fixa corporativo brasileiro, com um número relevante de empresas lançando ou concedendo mandato aos bancos para emissão de debêntures, CRIs, FIDCs e outros instrumentos.

Essa é a opinião de diretores das áreas de mercado de capitais de alguns dos principais bancos que originam operações de renda fixa para empresas. A crise externa, a perspectiva de queda da taxa de juro brasileira, a plena liquidez do mercado doméstico, além da facilidade de acesso a esses instrumentos, são os fatores apontados para justificar tal projeção. Eles comentam que o movimento visto neste final do ano é sinalizador de tal tendência e que o descanso se restringirá praticamente aos dias de Natal e Ano Novo.

 Muitas dessas operações previstas para o começo de 2012 já estão no pipeline dos bancos, ou seja, em estruturação ou aguardando para serem efetivamente colocadas no mercado. O superintendente executivo responsável pela área de distribuição de crédito do Banco Santander, Ignácio Lorenzo, estima que dez operações de renda fixa deverão ser apresentadas ao mercado até o Carnaval, sem precisar um montante. O sócio responsável pela área de renda fixa do BTG Pactual, Daniel Vaz, projeta algo na "casa de R$ 4 bilhões" para o primeiro trimestre. Ele diz que entre as prováveis emissoras do primeiro trimestre estão a maior parte das companhias listadas em bolsa do setor de shoppings centers, companhias do setor de energia e de properties (administradoras de propriedades).

 Já o diretor e responsável global pela área de renda fixa do Itaú BBA, Alexandre Aoude, banco que originou o maior número de operações esse ano, pelo ranking da Anbima, evita estimativas. “O que posso dizer é que o pipeline para o mercado local é muito forte e cresceu muito nos últimos 20 dias, após várias empresas terem enviado requisições de propostas para operações com CRIs, Fidic e debêntures aos bancos.”

 Aoude acrescenta que há muito trabalho previsto já na primeira semana de janeiro para a área de renda fixa do banco. "Em minha opinião, janeiro deve ser um mês muito gratificante, com volume de captação local semelhante a janeiro de 2011, que foi um mês forte", diz. "Diante das atuais condições externas, considero essa perspectiva um sucesso”, prevê. Em janeiro de 2011, foram originados R$ 3,471 bilhões em emissões de títulos de renda fixa no mercado local, segundo dados do boletim da Anbima.

Para ilustrar a atividade prevista nos primeiros três meses do ano, Vaz, do BTG, estima agenda cheia para os investidores e que haverá muita concorrência entre os emissores para agendarem encontros com os potenciais compradores de seus papéis. "As condições são ideais para as emissões no primeiro trimestre e 2012 tem tudo para ser melhor do que 2011", diz Vaz.

Aoude atribui o aquecimento do pipeline nos últimos dias do ano à revisão positiva nos planos de investimento de algumas empresas e à atividade no mercado de fusões e aquisições, o que agrega argumento à sua visão otimista para as perspectivas do mercado e da economia brasileira em 2012. "Embora o cenário externo exija atenção, o Brasil está diante de mais uma oportunidade de atravessar a crise sem grande dificuldade – teremos a questão da inflação no ano que vem, mas o governo está atento a isso", diz. O Itaú BBA projeta crescimento de 3,5% da economia brasileira em 2012 e a taxa de inflação, medida pelo IPCA, em 5,2%. Ele diz ainda que a inviabilidade de captação no mercado externo também contribuiu para que as empresas se voltassem ao mercado local como fonte de financiamento.

Aoude ressalta que a elevada liquidez existente no mercado faz a outra ponta e que se encontra hoje em nível mais elevado do que no ano passado. Ele considera que o crescimento econômico do País está, em parte, por trás do avanço na liquidez, além do já sabido efeito de queda das taxas de juro sobre os títulos do governo.

Ignácio Lorenzo, do Santander, acrescenta que as empresas se sentem hoje mais à vontade para se financiar no mercado de renda fixa, que teve bom comportamento ao longo de 2011, com a maior parte das operações bem-sucedidas, incluindo de novos entrantes. Ele diz ainda que, com a visão de uma opção confiável, algumas empresas passaram a se apoiar menos nas linhas de crédito tradicionais dos bancos e mais no mercado de renda fixa. "Não se trata ainda de uma tendência, mas houve queda no número de empresas tomando recursos diretamente com os bancos", afirmou Lorenzo. Em alguns casos, as companhias estão tomando recursos no mercado de renda fixa a custos menores do que os bancos estão tomando (nas captações por meio de aplicações em CDS e emissão de letras financeiras) para se financiarem.

Ele explica que o "Brasil vive um fenômeno que já teve lugar na Europa e nos Estados Unidos, onde as companhias de melhor perfil de crédito (rating AA ou melhor) estão conseguindo captar fundos no mercado de renda fixa local a preços muito competitivos. Isto deve dar lugar a um processo gradual de desintermediação onde, na medida do possível, estas companhias optarão pelo mercado de renda fixa como alternativa de financiamento às operações bancárias. No entanto, os bancos apresentam a vantagem de realizar uma execução mais rápida”, pondera.

Alongamento

Os executivos do Santander e do BTG Pactual dizem que o ambiente favorável ao mercado de renda fixa possibilitará algumas mudanças nas características dos títulos, entre elas o pequeno alongamento dos prazos. "Ao longo do segundo semestre deste ano, o prazo médio das operações remuneradas pelo CDI foi de 4,5 anos e temos ouvido que algumas operações terão prazo médio ampliado para cinco anos”, previu Daniel Vaz, do BTG Pactual. Ele acredita que mais empresas e de setores não recorrentes irão acessar a renda fixa – o que chama de democratização do mercado – e que as captações devem em média ser de R$ 300 milhões a R$ 400 milhões. Lorenzo, do Santander, avalia que algumas empresas podem conseguir se financiar ao prazo de até seis anos, em operações remuneradas pelo CDI, e oito anos, nas emissões remuneradas pelo IPCA.

O fator capaz de alterar essa dinâmica positiva traçada para o mercado local seria uma ruptura no exterior, "a la Lehman Brothers", afirma Vaz, em referência ao colapso do banco de investimento norte-americano em 2008 na esteira da crise do subprime. “A maior parte dos mandatos que o BTG tem para executar são para o primeiro trimestre”, diz Vaz, que aconselha: "As empresas que têm visibilidade das suas necessidades de financiamento ao longo de 2012 devem antecipar suas captações. O mercado está aberto agora e, embora acredite que o ano será bom, 2012 provavelmente será turbulento e não se sabe como o mercado vai estar no segundo trimestre”, calcula.

O executivo do BTG observa que seria muito difícil conter um efeito de contágio no mercado local seguindo-se a um evento de ruptura externa. A reação seria de paralisia do mercado, ou seja, a aversão ao risco poderia, no limite, levar gestores que estivessem com pouca posição de caixa e que precisariam atender aos saques, a tentarem vender debêntures a um preço muito baixo, já que esse mercado não tem liquidez. Ao mesmo tempo, os emissores também estariam com essa opção de financiamento fechada, dado que os investidores, nesse cenário, vão prezar pela liquidez, mantendo assim um porcentual maior dos recursos em “cash”, ao invés de comprarem ativos pouco líquidos como as debêntures.

(Cynthia Decloedt l Agencia Estado)

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