Aquisições estão mais difíceis

Todo mundo está de olho em todo mundo. Propostas são feitas, mas as aquisições não se concretizam. Uma das razões é o alto preço dos negócios. Isso dificultará, mas não impedirá novas compras, até porque há 53 redes bem cotadas no mercado de aquisições. Veja quais são:

O empresário Djalma Faria Cintra é dono da rede Bonanza, de Pernambuco. Segundo ele, sua empresa é constantemente assediada por grandes redes que desejam comprá-la. "Eu corto a conversa pela raiz. Não estou interessado em vender", diz ele. Para Cintra, a Bonanza atrai porque atua num mercado em ascensão – o nordestino – e tem lojas bem localizadas em cidades promissoras, como Caruaru e Garanhuns. Por que ele não vende? Porque só a divisão de varejo alimentar, que inclui 18 supermercados e um atacarejo, deve faturar R$ 400 milhões neste ano, 35,5% mais do que em 2010. Além disso, seus três filhos são diretores da empresa e um neto, de 23 anos, está começando a ser preparado para trabalhar na companhia. A ideia é que a empresa continue prosperando, mas nas mãos da família.

Outra rede nordestina, a Cardoso, localizada em Jequié, na Bahia, também foi assediada por uma empresa de grande porte: a Cencosud, dona do GBarbosa e do Bretas e quarta maior do setor. Só que depois de um ano de conversas, o empresário Márcio Cardoso, em acordo com sua família, também dona do empreendimento, decidiu arrendar as três lojas para a gigante chilena. "Não tivemos problemas financeiros ou de posicionamento, mas sentíamos dificuldade de conseguir recursos para acelerar o crescimento da empresa. Não alcançávamos a escala necessária para concorrer com a chegada das grandes redes na região", afirma Cardoso. "O processo emocional foi forte, mas concluímos que era uma boa alternativa para todos, inclusive para os colaboradores, que terão oportunidade de crescimento ao trabalhar numa multinacional", completa.

As histórias acima reproduzem bem os dois lados do atual momento de fusões e aquisições no setor supermercadista. Um cenário complexo. Ainda existem várias redes interessantes no mercado – empresas que atuam em regiões em expansão ou atendem nichos específicos capazes de complementar a atuação de potenciais compradores. Mas essas redes ou estão menos acessíveis, sobretudo porque ficaram mais caras, ou enfrentam compradores calejados, que no passado fizeram aquisições ruins e no presente não querem cometer o mesmo erro. Soma-se a esse cenário a situação difícil de alguns compradores tradicionais, como a rede Carrefour. A empresa que, em vários momentos, adquiriu inúmeras companhias – a mais recente, o bem-sucedido Atacadão –, agora está mais para rede a ser vendida. Sobram Pão de Açúcar e Walmart – a primeira ainda se recuperando do desgaste com a sócia Casino, causado pela tentativa de fusão com o Carrefour, e a segunda, ainda em fase de implementação de sua estratégia de Preço Baixo Todo Dia no País. Apesar disso, as três players impõem respeito às varejistas do exterior que olham o Brasil com muito interesse.

Como se vê, o movimento pró-aquisições atual tem ingredientes para apimentar a competitividade do setor nos próximos anos. Mas uma coisa é certa: é mais difícil hoje colocar as mãos em boas oportunidades do que no fim da década de 1990 e início dos anos 2000. Isso não significa que as negociações estejam congeladas, ao contrário, elas acontecem a todo momento, o difícil é concretizá-las. Um dos motivos é a precariedade de ofertas. Os melhores negócios já aconteceram. Sobraram menos empresas em condições de garantir ganhos de escala significativa. "Um bom negócio é aquele que traz maior capacidade de negociação, mas também de logística, marketing e mídia", afirma Roberto Leuzinger, vice-presidente da área de bens de consumo e varejo da consultoria Booz & Company.

Como se sabe, os alvos mais interessantes são as redes regionais. Boa parte delas elevou a eficiência operacional e de gestão e possui marca forte, além de lojas com boa localização. Algumas são líderes de mercado. "Ou seja, elas representam as melhores oportunidades de aquisição e se tornaram por isso mais caras", explica Leuzinger. Acrescente ao mérito das redes o aumento da renda e, consequentemente, do consumo. O resultado são vendas maiores do que no passado, o que também implica mais fermento no preço. "Hoje os interessados em ir às compras precisam pagar um ‘prêmio’ alto pelas empresas", acrescenta o executivo da Booz.

Em outras palavras, para vender um negócio bom e em expansão, o supermercadista quer receber bem mais do que fatura. Segundo o 40º Ranking de Supermercados de SM, 13 empresas com vendas entre R$ 455 milhões e R$ 3,5 bilhões – todas com perfil regionalizado –, cresceram 23,3% em termos reais em 2010, contra 7,5% das três gigantes do setor – Carrefour, Pão de Açúcar e Walmart. Juntas, as regionais somaram uma receita de nada menos R$ 18,6 bilhões. “É uma fatia tentadora do bolo supermercadista, mas se não bastassem as regras do mercado – desequilíbrio entre oferta e procura –, os potenciais compradores têm de enfrentar o apego dos donos às suas empresas. Das 13 regionais "tentadoras", apenas duas não são familiares, as restantes só entram fácil num processo de venda se estiverem em uma situação financeira ruim ou se receberem uma proposta espetacular, bem superior ao que vale a companhia", diz Antônio Sá, professor de pós-graduação da FAAP (Fundação Armando Álvares Penteado). Ari Kertesz, sócio da consultoria McKinsey, explica também que hoje boa parte das redes familiares consegue operar com crescimento em ‘mesmas lojas’, o que garante sua permanência no mercado de maneira competitiva, e descarta a necessidade de passar o negócio para a frente. De acordo com a pesquisa de SM publicada no 40º Ranking de Supermercados, 56 empresas com faturamento anual acima de R$ 10 milhões registraram crescimento real de 10% no ano passado com igual número de filiais de 2009. No levantamento anterior, 43 redes conseguiram esse feito – 13 a menos do que em 2010.

"Ficou realmente caro comprar empresas brasileiras", afirma Horst Paulmann, presidente fundador do grupo chileno Cencosud, dono das bandeiras GBarbosa e Bretas. "Nosso crescimento será principalmente orgânico. É mais vantajoso hoje construir as próprias lojas do que ir às compras. Aquisições não estão descartadas, mas só ocorrerão se a oportunidade for muito interessante", acrescentou em entrevista recente.

Não é difícil reconhecer os melhores alvos de aquisições, basta analisar o ranking de faturamento do setor, por Estado ou região, e reconhecer as redes com elevado índice de vendas por metro quadrado, elas são mais lucrativas. Para Kertesz, da Mckinsey, empresas com vendas/m2 acima de R$ 20 mil são as mais atraentes, enquanto as que ficam entre R$ 15 mil e R$ 20 mil/ano apresentam resultado mediano. Estas podem representar boa oportunidade se a empresa compradora tiver espaço para ampliar esse valor até a faixa mais produtiva. Isso é possível, por exemplo, com os chamados ganhos de sinergia ou de eficiência – operacional, logística, comercial e de gestão.

Luiz Paulo Silveira, diretor da Apsis, consultoria especializada em avaliação de empresas e marcas, acredita que também começam a ser cobiçadas redes com 5 a 10 lojas, "Muitas já têm uma boa marca e não exigem investimento elevado", diz.

Para se tornar alvo de aquisição, contudo, além de uma operação eficiente, é preciso ter uma marca respeitada e com força em relação à concorrência, além de contar com um mercado de consumo vibrante. É preciso também haver uma boa organização interna. Quem explica é outra executiva da Apsis, Isabel Nielebock, "Para se chegar a um preço justo, uma empresa depende de informações internas acuradas. É necessário ter controle de todos os ativos, contar com inventários atualizados e não possuir pendências fiscais ou trabalhistas", conta. 

O jogo, portanto, entre compradores e compráveis não está fácil em nenhum aspecto. Mas isso não significa que crescer por meio de aquisições seja hoje inviável. Só demonstra que as empresas terão de se adaptar aos novos tempos e encontrar formas de viabilizar as transações com sabedoria e benefícios de todos, inclusive do consumidor.

(Alessandra Morita | Revista Supermercado Moderno)

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