De saída do Cade, Badin prevê explosão de fusões e aquisições em 2011

BRASÍLIA – Arthur Badin trabalha, hoje, o seu último dia como presidente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e acredita que o governo da presidente eleita Dilma Rousseff terá uma série de desafios para promover a concorrência entre as empresas. Primeiro, o governo Dilma deverá conviver com uma onda crescente de fusões e aquisições devido ao aquecimento da economia, depois dos efeitos da crise americana que teve início em setembro de 2008. "Para 2011, deve ocorrer uma explosão de operações", previu Badin, ontem, em entrevista de despedida e balanço.

Para dificultar a situação do Cade, essas fusões deverão ser mais complexas, segundo ele, pois a concentração tende a aumentar em vários mercados. Com isso, diversos setores da economia terão cada vez mais um número menor de empresas competindo.

Para completar esse cenário, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva incentivou a formação de "campeãs nacionais" – grandes empresas que, com o apoio financeiro do governo, através de recursos do BNDES, realizaram fusões e aquisições e passaram a ser ainda maiores do que eram antes. Isso ocorreu, por exemplo, no setor de telefonia, com a compra da Brasil Telecom pela Oi. A tendência inicial é que essa política continue no governo Dilma. Diante dela, há um desafio adicional para o Cade: como manter a competição em setores com empresas líderes que contam com apoio governamental?

Badin entende que o órgão deve fazer o controle sobre essas campeãs nacionais e, segundo ele, o BNDES compreende essa função. "O Cade não é contrário a grandes empresas", disse. "O BNDES é um braço para instrumentalizar políticas do governo e o faz sem passar por cima do Cade."

A gestão de Badin foi a mais rigorosa da história do Cade. Ela registrou a maior multa por cartel, de R$ 2,3 bilhões, no caso das empresas de gases industriais; o maior acordo com um cartel, nos R$ 100 milhões pagos pela Whirpool para encerrar um processo contra si; e a maior multa a uma única empresa, no episódio em que a AmBev foi condenada a pagar R$ 352 milhões por causa de um programa de fidelização de pontos de venda. "Eu não identifico mão pesada no Cade. O rigor foi de acordo com a lei", disse.

Apesar desses marcos, Badin deixa o cargo com uma grande derrota: ele não conseguiu aprovar o projeto de lei que cria o Super-Cade. O projeto significa a união dos três órgãos antitruste – o Cade e as secretarias de Direito e de Acompanhamento dos ministérios da Justiça e da Fazenda (SDE e Seae) – num só, mais equipado e com mais poderes. Além disso, ele prevê a aprovação prévia das fusões e aquisições. Isso evitaria os Apros, os Acordos de Preservação da Reversibilidade da Operação, nome técnico dos termos que são assinados com grandes empresas evitando a consumação da fusão, deixando-as separadas.

"O sistema de Apros está se transformando no pior dos mundos", apontou Badin. Segundo ele, as empresas ficam proibidas de gerar eficiências, pois os Apros vedam a continuidade de seus negócios. Com isso, há uma perda de investimentos. A fusão fica parada "e o Cade não tem prazo para julgar".

Atualmente, negócios como a união entre o Ponto Frio e as Casas Bahia e a compra da Sadia pela Perdigão estão parcialmente suspensos por causa de Apros. Esses acordos seriam extintos com a aprovação do projeto de lei, mas, apesar do empenho pessoal de Badin, o texto não foi aprovado pelo Congresso. Ele passou na Câmara dos Deputados e em cinco comissões do Senado. Badin aceitou mais de 40 emendas ao texto original e acredita que o projeto pode ser votado ainda neste ano. Uma delas previa reduzir a multa mínima por cartel de 1% para 0,1%. Ela nasceu de críticas de senadores às multas milionárias do Cade, que chegaram a 50% do faturamento da White Martins, no caso do cartel dos gases. Ao fim, essa emenda não foi incorporada. "O projeto atual é melhor do que o anterior. Os pilares do original foram mantidos."

Badin disse que cumprirá uma quarentena de quatro meses. Os dois primeiros serão dedicados à universidade e à família. Nos dois meses seguintes, Badin cogita ir à Índia para meditar. Depois, vai voltar a advogar. Badin não revelou onde atuará e também não falou de candidatos a sua sucessão. "Quem tem que responder a isso é o governo." Mas fez um alerta. Segundo ele, é importante que o processo de sucessão dos órgãos antitruste – Cade, SDE e Seae – "seja acompanhado de perto". "Isso pode ser determinante para essa trajetória ascendente", disse Badin, referindo-se às fusões e aquisições.

A expectativa é de que o conselheiro Fernando Furlan, o decano no órgão antitruste, assuma a Presidência interinamente e, depois, seja indicado presidente em definitivo, ou por Lula ou por Dilma.

(Juliano Basile | Valor)

 

 

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