A hora e a vez dos avaliadores

A CVM editou, em 25 de novembro de 2010, a Instrução CVM nº 487, que modifica o regime das ofertas públicas de aquisição de ações (OPA). A atualização da Instrução CVM nº 361 de 2002 veio motivada principalmente pela necessidade de adaptação do mercado brasileiro ao novo cenário esperado de ofertas públicas para aquisição do controle de companhias abertas sem acionista majoritário, operação comum em mercados internacionais como o americano e o inglês.

Conforme apresentado no site da CVM, seguem as principais inovações:

i. Detalhamento do dever de sigilo a que se sujeita o ofertante antes da oferta e dos procedimentos que ele deve observar caso a informação sobre o lançamento da oferta escape ao seu controle (art. 4º-A);

ii. Obrigatoriedade de identificação, com 10 dias de antecedência, de terceiro que pretenda interferir no leilão de uma OPA (art. 12, §4º);

iii. Adaptação das regras de leilão para o caso de OPA para aquisição de controle, com a vedação (a) de interferência de terceiros por lote inferior ao visado pelo ofertante; e (b) de elevação de preço no leilão pelo ofertante caso tenha sido lançada uma oferta concorrente (art. 12);

iv. No caso de OPA total para aquisição do controle acionário, outorga de opção de venda aos destinatários dessa oferta por 30 dias após o leilão (art. 32-A); na prática, essa norma dá ao acionista a possibilidade de aceitar a oferta após o leilão, evitando que ele seja coagido a vender suas ações por preço que considera inadequado;

v. No caso de OPA parcial para aquisição do controle acionário, criação de um procedimento de leilão que permite aos destinatários dessa oferta aceitá-la de forma condicional: eles venderão as ações caso a oferta tenha sucesso, mas, para isso, a oferta precisa ser aprovada de modo incondicional por titulares de um número de ações que assegurem ao ofertante o controle da companhia (art. 32-B). Mais uma vez, o objetivo desse procedimento é garantir a liberdade do acionista de escolher se aceita ou não a oferta;

vi. Aumento substancial na quantidade e qualidade de informações a serem divulgadas, no caso de OPA para aquisição de controle, pelo ofertante, pela companhia objeto, seus administradores e principais acionistas, sobretudo quanto a negócios por eles realizados envolvendo ações e derivativos durante o período da OPA (art. 32-C a 32-G); e
vii. Aperfeiçoamentos nas regras que regem os laudos que devem ser contratados pelo ofertante em algumas modalidades de OPA, acerca do trabalho esperado e da responsabilidade dos avaliadores.

Nós, avaliadores, recebemos esta atualização como um maior reconhecimento do papel e da responsabilidade do avaliador neste mercado de reestruturações societárias, permitindo cada vez mais uma transparência das operações e um consequente amadurecimento e fortalecimento do mercado de capitais, dentro das boas práticas de Governança Corporativa.

É antiga a luta da APSIS para uma regulamentação no Brasil das normas de avaliação de empresas, não prevista na Lei das S/A, mas imprescindível num ambiente contábil que se propõe a migrar de CUSTO para VALOR (fair value).

Esta falta de regulamentação nos fez adotar na APSIS a instrução 361/02 como a melhor referência do mercado, pois entendemos que a CVM reconhece os critérios de avaliação nela apresentados como extensivos aos demais processos de avaliação (a exceção do Art. 264, que deixa bem claro a necessidade de avaliação das empresas envolvidas pela Abordagem de Custo do Patrimônio Líquido ajustado a Mercado, segundo os mesmo critérios).

Dentre as principais alterações correlatas ao processo de avaliação, destaca-se o aperfeiçoamento das regras necessárias para a elaboração dos laudos técnicos. Os critérios de avaliação previstos no Art. 8º (preço médio ponderado de cotação de ações; valor do patrimônio líquido contábil por ações; e valor econômico calculado por fluxo de caixa descontado ou por múltiplos) foram substituídos por um anexo completo, com maiores detalhamentos.

Dentre eles, podemos destacar os seguintes:

• As informações usadas para elaboração dos laudos devem não só constar nos laudos de forma clara, mas o avaliador passa a ser responsável por analisar a qualidade e a coerência destas no contexto da avaliação.

• Como o laudo poderá ser utilizado por usuários não especializados, as expressões em língua estrangeira devem ser obrigatoriamente traduzidas no Glossário.

• O laudo de avaliação deverá conter as assinaturas e a identificação dos profissionais responsáveis pela avaliação, bem como do representante da empresa responsável pelo laudo.

• O laudo de avaliação conterá um Sumário Executivo com as informações relevantes, tais como: principais informações e conclusões; critérios e principais premissas utilizadas; método de avaliação escolhido; taxa de desconto utilizada; valor ou intervalo de valor apurado em cada metodologia utilizada e quadro comparativo; indicação do critério de avaliação considerado como o mais adequado e sua justificativa.

• O laudo também deverá conter as declarações do avaliador quanto à qualificação técnica da empresa (necessária à realização do trabalho) e histórico de relacionamento comercial com o cliente.

• Passa a ser obrigatório a inclusão de itens relevantes para a projeção de cenários, como a descrição da empresa, seu mercado de atuação, premissas macroeconômicas e investimentos em Capex (ativo imobilizado).
Com relação às metodologias de avaliação propriamente ditas, não houve grandes mudanças conceituais. O laudo continua a apresentar o Valor Apurado pelos Diferentes Critérios, porém a instrução contempla uma forma mais detalhada para as metodologias obrigatórias:

a) o preço médio ponderado de cotação das ações da companhia objeto na bolsa de valores ou no mercado de balcão organizado, discriminando os preços das ações por espécie e classe deve ser apurado nos 12 (doze) meses imediatamente anteriores à publicação até a data do fato relevante; e agora também entre a data de publicação do fato relevante e a data do laudo de avaliação.

b) valor do patrimônio líquido por ação da companhia objeto apurado nas últimas informações periódicas (anuais ou trimestrais) enviadas à CVM;

c) valor econômico da companhia avaliada, com indicação, inclusive, do valor por ação, calculado por, pelo menos, uma das seguintes metodologias: fluxo de caixa descontado; múltiplos de mercado; ou ainda por múltiplos de transação comparáveis, conforme se entender fundamentadamente mais adequado ao caso da companhia, de modo a avaliá-la corretamente.

d) outro critério de avaliação escolhido pelo avaliador geralmente aceito no ramo de atividade da companhia avaliada, previsto em lei ou aceito pela CVM.
Cabe salientar que todas as metodologias propostas devem ser acompanhadas da descrição de critérios e premissas justificadas, memórias de cálculo (como no caso da relevante variável “taxa de desconto”), unidade monetária, entre outros.

De modo geral, estas orientações previstas no ANEXO III da INSTRUÇÃO CVM Nº 361 contemplam as práticas padrão do processo de avaliação de empresas, não exigindo dos avaliadores nada mais complexo do que as etapas já esperadas de um trabalho de qualidade.

Nos meus mais de 20 anos de atuação neste mercado, recebo com muita tranquilidade esta instrução e a obrigatoriedade destas práticas comuns às empresas de avaliação reconhecidas pelo mercado por sua qualidade técnica, e já cumpridas integralmente pela APSIS em seus mais de 30 anos de existência. Mais um ganho para o mercado de capitais e as boas práticas da Governança Corporativa!

Ana Cristina França
Sócia-diretora da APSIS

Clique aqui para acessar a íntegra da Instrução CVM nº 487/10, a versão comparada da Instrução CVM nº 361/02 e o Relatório de Audiência Pública. 

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