“Joie de vivre” brasileira na prateleira

O maior guru do varejo de luxo americano, Marvin Traub, peça-chave nas negociações de Calvin Klein, Christian Dior, Estée Lauder e Value Retail no mundo, está buscando marcas brasileiras para desenvolver no exterior. Sua empresa, a Marvin Traub Associates, procura grifes que representem tudo que os estrangeiros aspiram no estilo de vida tupiniquim: praia, sol e mar. "Entre os Bric, o Brasil é um dos que têm uma imagem que americanos e europeus mais aspiram, pois é ocidental e inspiradora. Marcas brasileiras globais refletem paixão, diversão, são cheias de ”joie de vivre”", diz Traub.
 
O consultor está no páreo para comprar a Osklen (assim como PPR, LVMH e Alpargatas, como declarou o proprietário da marca, Oskar Metsavaht). A grife carioca não é a única que está na mira da consultoria americana, que tem sido frequentemente abordada por brasileiros em busca de ajuda para realizar o sonho de ganhar o mercado global e de empresas interessadas em abrir lojas no Brasil.
 
O presidente da consultoria e braço direito de Traub, Mortimer Singer, não dá detalhes sobre a negociação com a grife de Metsavaht, mas diz que considera a Osklen "uma marca maravilhosa, de um empresário muito forte e que tem muito potencial para ser vendida no mundo todo". Para ele, é fundamental que grifes brasileiras busquem parcerias para alavancar sua internacionalização, seja joint ventures com investidores estrangeiros, ou com ajuda de parceiros nacionais.
 
O executivo também não revela quem são seus clientes brasileiros. "O que posso dizer é que meu sócio, Marvin, é muito próximo de Diane Von Furstenberg e ela frequentemente nos diz como o negócio dela é surpreendente no Brasil. A loja [no shopping Iguatemi, em São Paulo] vende muito bem." Apesar da discrição ao falar dos negócios, Singer não hesita em deixar claro o desejo de trabalhar mais no Brasil. "Eu e meus parceiros gostaríamos de passar os próximos anos focados em tornar marcas brasileiras globais."
 
Singer viaja ao Brasil com regularidade para estudar o mercado e diz que várias grifes nacionais têm as características necessárias para se tornarem globais. Entre elas, cita a Chilli Beans (que tem seis lojas em Los Angeles, seis em Portugal, duas na Colômbia e uma em Angola) e a Luta (que tem loja em Londres), marca de roupas esportivas ligada à ONG Luta Pela Vida.

Para exemplificar o poder do lifestyle de uma marca para sua internacionalização, Singer lembra que algumas das grifes mais bem sucedidas deixam claro no desenho de seus produtos o estilo de vida de seu local de origem. É assim a Ralph Lauren, com seu caubói inglês, a Lacoste, com a atitude esportiva à francesa, e Michael Kors, que evidencia o glamour hollywoodiano.
 
China, Oriente Médio e Brasil são os destinos mais procurados pelas grifes para que a Traub faz consultoria. "Brasil, México, Índia, África do Sul e Oriente Médio são populações jovens e com classe média emergente, que deseja grifes", diz Singer. A empresa foi responsável por levar a Harvey Nichols a Dubai, onde tem seu maior espaço fora do Reino Unido, em 13 mil m2 no Mall of Emirates, além de instalar a Oscar de La Renta em pontos estratégicos de Nova York – o que fez a grife dobrar do volume de vendas em um ano.
 
Como casamento entre um lifestyle promissor e uma joint venture com um investidor não acontece da noite para o dia, muitas grifes brasileiros hoje traçam caminhos mais tímidos no exterior. O mais comum deles é contratar um showroom fora para entrar em lojas multimarcas e aos poucos chegar às grandes redes, como Macy”s, Saks e Bloomingdale”s. Mas fincar o pé nas prateleiras dessas lojas tão disputadas é muito difícil e não são poucas as marcas que conseguem ficar só uma ou duas estações com espaços nessas cobiçadas araras – normalmente por falhas na entrega ou por fazer mudanças muito bruscas nas coleções, desagradando os compradores. Para Singer, as empresas que desejam estar no mercado americano, que aos poucos está voltando a ganhar fôlego, devem procurar construir uma relação de confiança com as lojas. "É preciso conquistar parceiros e estar aqui de verdade, ter representantes e conhecer as pessoas", diz.
 
"Particularmente nos Estados Unidos, onde o mercado de atacado é de longe o mais importante, relacionamentos têm papel muito importante. Por isso, quando saem de seus países, essas marcas precisam ser guiadas por um talento local, que tenha a confiança de varejistas locais", completa Traub. Questionado sobre o que é preciso para ter sucesso global, ele sem titubear enumera quatro passos: forte ponto de vista de marca, forte gerenciamento, boa vontade para investir em uma equipe internacional, no país de origem e fora dele, e habilidade para adaptar produtos a diferentes mercados.
 
Se por um lado as grifes brasileiras estão no caminho para sua internacionalização, do outro, empresas estrangeiras têm feito ferver o mercado de luxo nacional. Ainda neste semestre abrem as portas no Brasil Miu Miu, Lanvin, Nicole Miller, Tory Nuch, Etiqueta Negra, Ladurée e Valentino. Na esteira do mercado promissor, as grandes lojas de departamento americanas também têm rodeado os consultores em busca de oportunidades no Brasil. "Tenho sido abordado por pessoas interessadas nisso. Eu diria que as grandes lojas de departamento, de luxo em particular, ouviriam propostas de investidores brasileiros, mas é preciso ser apresentado pela pessoa certa e ter um grande parceiro do varejo que saiba lidar com marcas internacionais", diz Singer. Para ele, um grupo local é fundamental para orientar as redes sobre o gosto dos brasileiros para as compras. "Uma Bloomingdale”s ou uma Saks não poderia aparecer de repente e começar a operar. Precisariam de ajuda para entender os clientes e se aproximar deles."
 
A Marvin Traub trabalha no desenvolvimento de marcas no mercado americano e fora dele, desenvolvimento de franquias e licenciamentos. Seu forte está no relacionamento das marcas com grandes varejistas, como Al Tayer, que opera dezenas de grifes de luxo no Oriente Médio, a loja de departamento Harvey Nichols e a Value Retail, da rede Chic Outlet. Um dos parceiros da Marvin Traub nas negociações é o Atlas, um banco de investimentos com escritórios em São Paulo e em Nova York, fundado em 2004 pela brasileira Roberta Mazzariol e por Palden Namgyal. A Atlas e a Traub fizeram juntas a venda da marca americana de jeanswear Rock & Republic para a VF Corp e da holandesa Scotch & Soda para a Kelwood.
 
O desenvolvimento do trabalho no varejo vem da experiência de Traub, que aos 86 anos carrega no currículo 61 anos de carreira, 41 deles na Bloomingdale”s, onde entrou como assistente de merchandise, foi presidente e por 13 anos, até 1991, exerceu o cargo de CEO. No ano seguinte, criou a Marvin Traub Associates, com sede em Nova York, que começou com negócios criados a partir da extensa rede de amigos e contatos formada por ele ao longo da carreira. Amigo íntimo de Ralph e Ricky Lauren, dos Missonis, Fendis e Lauders, Traub nasceu no varejo. Sua mãe foi diretora da loja de departamento americana Bonwit Teller e seu pai o primeiro licenciado da Christian Dior.

(Rebeca de Moraes | Valor)

 

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