Mais competitividade para a indústria nacional

A construção civil é um dos termômetros do desempenho econômico. Durante os duros anos 80 e 90, a estagnação do país refletiu diretamente sobre o setor, que felizmente vive, hoje, uma pujante fase de expansão iniciada na última década. De acordo com dados da Câmara Brasileira da Indústria da Construção, em 2011 o crescimento no setor foi de 4,8% em relação a 2010 – acima, portanto do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. Esse resultado coloca o país bem à frente de qualquer efeito negativo em relação à crise na Europa. A entidade ressalta que a construção civil será o grande destaque da economia este ano, com crescimento projetado de cerca de 5,2%, acima do esperado para o PIB. Há ainda quem, no setor, tenha a expectativa de que o crescimento chegue a 8% ou 9%.
 
Mas o bom momento, alicerçado em três pilares – crédito, emprego e investimento – não significa que ainda não haja gargalos a serem superados. No que se refere à indústria, o desafio atual é estimular a redução da importação de materiais do setor, que a partir de 2008 sofreu uma invasão de itens vindos principalmente da China. Enquanto isso, no exterior, sobram produtos por causa da fraca atividade econômica dos países desenvolvidos, o que significa preços mais atraentes para importação.
 
Entidades ligadas à indústria da construção civil já se uniram para reivindicar medidas do governo que incentivem o aumento da produção de materiais nacionais. Um dos frutos foi o lançamento, em agosto do ano passado, do Plano Brasil Maior, um conjunto de ações do governo federal que tem como objetivo dar competitividade à indústria nacional, incluindo a construção civil. Dentro do pacote, medidas como a isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) até o fim deste ano e benefícios a quem privilegiar fornecedores locais, como a liberação mais rápida de recursos e linhas de crédito. Construtoras que tomarem linhas oferecidas pela Caixa Econômica Federal não poderão mais usar materiais importados ou em desconformidade com os padrões.
 
A medida foi comemorada pelos organismos ligados ao setor, mas pode ser considerada como um primeiro passo rumo à competitividade sustentável. Um dos pedidos feitos ao governo é de manter a isenção do IPI por tempo indeterminado, uma vez que o programa Minha Casa, Minha Vida ainda estará em vigor ao menos até 2014 e a medida facilitaria o atendimento da demanda. A adoção de defesas comerciais, a manutenção de uma política econômica que privilegie juros menores e câmbio mais alto – deixando os preços nacionais mais atraentes -, além da certificação dos insumos importados fazem parte do caminho que o Brasil precisa trilhar para garantir esta sustentabilidade. O Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) está estudando as alternativas para exigir do produto importado as mesmas exigências de certificações dos nacionais.
 
Em 2010, as importações de materiais chegaram ao valor recorde de US$ 6 bilhões, marca que deve ser batida, em 2011, quando se espera US$ 7 bilhões, conforme números mais recentes do levantamento realizado em parceria pela Associação Brasileira da Indústria de Materiais de Construção (Abramat) e pela Fundação Getulio Vargas (FGV). O total das importações de materiais de 2010 corresponde a cerca de 10% dos R$ 105,4 bilhões faturados pelo setor. E boa parte das indústrias teria condições de substituir importações e atender ao mercado interno se não fosse o câmbio defasado.
 
Apesar das boas notícias trazidas pelo plano Brasil Maior, outro gargalo importante do setor é a capacitação de mão de obra. Existe, hoje, uma cultura de qualificar nos próprios canteiros. Ou seja, já há uma percepção desta necessidade de qualificação pelos empresários, mas é preciso mais, com a criação de uma política nacional, mais ampla. Uma das tentativas mais recentes neste sentido é a criação do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), sancionado pela presidente Dilma Rousseff recentemente e que prevê parcerias com diversas entidades, como o Sistema S e escolas técnicas estaduais de todo o país.
 
A competitividade da indústria, não apenas da construção civil, depende de uma gama enorme de ações, em diversas áreas: da tributação excessiva ao custo do crédito, da melhoria da infraestrutura à criação de parques tecnológicos e de reforços na educação. Outro capítulo à parte é a necessidade premente de inovação, que só é conquistada após investimentos maciços em pesquisa, desenvolvimento e formação de profissionais, de maneira a gerar insumos de qualidade e competitivos como os que a China e a Coreia do Sul, principais exportadores do setor, enviam para o país.
 
Por isso, a meta da competitividade da indústria é uma agenda a ser trabalhada a longo prazo, e se confunde com a urgência na aprovação de reformas econômicas e estruturais. É um enorme desafio repensar uma atividade com as características da indústria da construção, tradicionalmente artesanal e marcada pela informalidade.
 
Agostinho Guerreiro é presidente do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Rio de Janeiro (Crea-RJ).

(Valor)

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