Resultados das companhias frustraram os investidores

Os resultados apresentados pelo setor de construção civil nesta temporada de balanços frustraram, novamente, os investidores. Embora a recorrência de alguns problemas, como margens pressionadas pelos projetos imobiliários de safras antigas, fosse esperada, novos pontos, como o aumento do número de rupturas de contratos de venda, chamaram a atenção do mercado, que avaliou que, em geral, o desempenho do setor ficou abaixo das expectativas. Nesse cenário, as incertezas sobre problemas que possam ser reportados nos próximos trimestres pelas incorporadoras ganharam força.
 
"Desde que rebaixamos nossa percepção sobre o setor no Brasil para neutra, em fevereiro de 2011, o sentimento em relação às construtoras só piorou", afirmam os analistas Jason Mollin e Gabriel Cotellessa, do Goldman Sachs, em relatório. "Escassez de mão de obra, atrasos de projetos, custos mais altos de insumos e monitoramento limitado de locais de construção continuam a pesar sobre as margens e o reconhecimento de receita mais do que o esperado, levando-nos a reduzir as estimativas de novo", completam.

A tendência é que as margens, indicador de rentabilidade, melhorem à medida que os empreendimentos antigos, menos rentáveis, forem entregues e a participação deles na composição da receita for reduzida. Embora isso deva acontecer um pouco no segundo trimestre, o impacto maior da saída desses projetos do portfólio das incorporadoras aparecerá no segundo semestre e, principalmente, em 2013. "As melhoras do segundo trimestre não vão ser suficientes para voltar a animar o investidor que está muito decepcionado com os resultados do setor", diz o analista do setor imobiliário da Banif Corretora, Flávio Conde.
 
No caso da PDG Realty, os projetos lançados de 2007 a 2009 tiveram margem bruta de 10% no trimestre. A margem bruta da PDG foi de 19% no período, considerando também os projetos lançados desde 2010, mais rentáveis.
 
A partir do segundo semestre, o efeito dos ajustes feitos pelas empresas para aumentar o controle de custos de obras e reduzir despesas gerais e administrativas contribuirá para melhoras mais expressivas no desempenho do setor, conforme Conde.
 
O ritmo de lançamentos e vendas deve crescer no segundo trimestre. Nos três primeiros meses do ano, a prioridade das incorporadoras foi comercializar estoques e preservar caixa, o que se refletiu em redução do volume lançado por boa parte do setor e, em parte dos casos, em menos vendas. O menor volume comercializado foi uma das razões para a queda da receita registrada por empresas como a Tecnisa, em que o indicador caiu 33% no trimestre, na comparação com um ano antes. A companhia teve prejuízo no trimestre.
 
No período, outro fator que teve impacto na receita e, consequentemente, no resultado líquido foi a ruptura de contratos – os chamados distratos -, que vem crescendo com o aumento das entregas, como ocorreu com Brookfield Incorporações, Rossi Residencial e Viver. Os distratos das unidades da Tenda, assim como margens menores dessa divisão, levaram a Gafisa a mais um trimestre de prejuízo líquido. "Nas empresas que têm de entregar muitas unidades, pode haver aumento dos cancelamentos", diz o analista de construção do BES, Eduardo Silveira.
 
Outro problema do setor é o atraso na entrega de empreendimentos, por atraso no processo de produção ou na liberação do habite-se. "As empresas entregaram, no primeiro trimestre, apenas de 10% a 15% da média do total previsto para o ano", diz o analista do BES. A Rossi, por exemplo, informou que reduziu a meta de entregar de 18 mil a 20 mil unidades, neste ano, para 16 mil a 18 mil unidades, devido à burocracia no processo de obtenção do habite-se.
 
A divulgação dos resultados deixou claro também que o fantasma dos estouros de orçamento ainda assombra o setor. A Brookfield informou que revisões de custos em alguns projetos tiveram impacto de R$ 21,4 milhões nos resultados. A companhia revisou apenas de 15% a 20% do total de projetos, o pode significar mais impactos negativos no segundo trimestre, perspectiva que incomodou os investidores. A PDG informou que não houve revisão de custos nem estouros no primeiro trimestre, mas que as revisões do trimestre anterior ainda contribuíram, negativamente, para os resultados.
 
"As companhias deixaram de fazer revisão anual dos orçamentos para fazer verificações trimestrais, o que tende a diminuir surpresas de grande porte", afirmam os analistas Iago Whately e René Brandt, da Fator Corretora. Entretanto, ssa estratégia deve gerar ajustes, ainda que menores, trimestralmente, com impacto nos resultados.
 
Um outro ponto que chamou a atenção do mercado foi a concessão de descontos pelas construtoras na venda de imóveis. Os analistas da Fator destacaram o caso da MRV. "A não correção do preço de venda pelo INCC nas unidades atrasadas representam, na prática, descontos implícitos oferecidos pela companhia. A prática do desconto busca agradar o cliente e evitar com que ele acione a Justiça contra a companhia", afirmam. Na avaliação deles, a prática adotada pela MRV será comum entre as incorporadoras com alto volume de obras em atraso. "E isso tem impacto potencialmente negativo sobre as margens."
 
Num momento em que geração de caixa e rentabilidade são prioridades em relação a crescimento, a venda de terrenos, principalmente, de áreas destinadas a projetos de longo prazo, se torna mais comum. No trimestre, essas operações atenuaram a piora dos resultados de algumas empresas, caso de Brookfield, que teria prejuízo sem a venda de terrenos, e Rossi, cuja comercialização de áreas respondeu pela maior parte do lucro. A Gafisa informou que espera vender R$ 100 milhões em terrenos não estratégicos até o fim do ano.
 
A comunicação das incorporadoras com o mercado ainda é alvo de críticas. "Na divulgação de resultados, a comunicação melhorou. Durante o trimestre, porém, as empresas reforçaram o que poderia vir bom, mas não tocaram em pontos ruins fundamentais, como cancelamentos e obras em atrasos", disse um analista.

(Chiara Quintão e Silvia Fregoni | Valor)

 

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