CSN aprova plano de investimento de R$ 34 bi até 2016

Benjamin Steinbruch, principal acionista da CSN: plano é bastante ousado porque envolve cinco áreas de negócios
O empresário Benjamin Steinbruch, principal acionista e presidente da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), acaba de aprovar no conselho da empresa um plano de investimento de R$ 34 bilhões até 2016. O valor é gigante, pois abrange um leque de investimentos enorme: muitos dos projetos já estão em andamento, uns com pendências para sair do papel. Há o caso da ferrovia Transnordestina, de R$ 5,4 bilhões, com mais dificuldade de avançar, que depende também de decisões de governos.

Ele se diz otimista com a economia do país, que, ao seu ver, pode receber mais 60 milhões de novos consumidores. "Só depende de três fatores básicos: geração de emprego, renda e crédito". Por isso, confiante na força que ganhou o mercado interno brasileiro, enxerga que é o momento para definir investimentos nos atuais e novos negócios. Exemplos: fabricação de cimento e de aços longos.

"Queremos ter 20% de cada um desses dois mercados", diz. O foco é a expansão de moradias, de obras industriais, comerciais e de infraestrutura. Após perder a disputa pela compra, com oferta de quase US$ 6 bilhões, da cimenteira portuguesa Cimpor, a aposta nesse negócio, agora, concentra-se no mercado brasileiro. Prevê, até 2013, investir quase US$ 1 bilhão em três fábricas e na expansão da atual. "Como não vejo nenhum grupo disposto a vender ativos no Brasil, vamos investir em novas fábricas". O apetite por aquisição, entretanto, permanece vivo. A CSN recebeu ofertas de crédito na época superior a três vezes ao valor.

Cerca de 80% dos recursos do programa de investimento até 2016 será alocado em aços planos e longos e na mineração de ferro. A área de mineração, que já está no meio do caminho do plano de atingir 110 milhões de toneladas até 2014, é a grande aposta.

Steinbruch não esconde de ninguém que almeja formar a quarta maior mineradora de ferro do mundo, atrás de Vale, Rio Tinto e BHP Billiton. Hoje, é a sexta. A previsão é atingir este ano 4% do mercado transoceânico de minério de ferro, com exportação de 40 milhões de toneladas, e 6% em 2015, com cerca de 90 milhões de toneladas. Nessa área, os investimentos projetados – Casa de Pedra, Namisa e área portuária – estão orçados em R$ 13 bilhões.

Boa parte dos recursos desse plano, o empresário espera obter com a abertura de capital de seus negócios – o processo mais avançado é o da mina de ferro Casa de Pedra, que poderá se unir à controlada Namisa. A nova previsão é julho. Avaliações de analistas apontam que a CSN pode obter, só nessa operação, no mínimo US$ 10 bilhões. Em março, ele chegou a admitir cifra de US$ 20 bilhões. Agora, preferiu não falar em valores.

Com receita líquida de R$ 11 bilhões e lucro de R$ 2,6 bilhões no ano passado, a empresa tinha, no fim de dezembro, uma situação financeira confortável. O caixa estava em R$ 8,1 bilhões e a dívida líquida, de R$ 6,3 bilhões. Os investimentos de 2010 estão orçados em R$ 4 bilhões – de 2011 a 2016, a média anual seria de R$ 5 bilhões. A avaliação no mercado é que a companhia, com esse perfil, tem capacidade de se endividar.

Nessa entrevista ao Valor, um dia depois da alta de 0,75% na taxa Selic, o empresário criticou a decisão, qualificando-a de "defesa do medo" por parte do Banco Central. "Foi uma decisão desnecessária e inoportuna, pois não vejo nenhum sinal de superaquecimento da economia". Abaixo, os principais trechos da entrevista.

Valor: Qual a sua visão da economia brasileira neste momento?

Benjamin Steinbruch: Vive seu melhor momento desde que me conheço por gente. É decorrente de uma convergência de fatores positivos no mercado interno, que ganhou 60 milhões de novos consumidores, com a situação extraordinária por conta do crescimento da China. A força de compra de matérias-primas que esse país exerce sobre o mundo vem favorecendo bastante o Brasil. Aqui, os novos consumidores estão em busca da sua primeira casa, da primeira geladeira, do primeiro carro e do primeiro fogão. Isso faz com que o Brasil, de certa forma, se mantenha independente de flutuações do mercado externo. Na verdade, é a primeira vez que o Brasil se faz com as próprias pernas, pois sempre esteve dependente do exterior. Os países que estão dando certo estão ancorados no fortalecimento de seus mercados.

Valor: O que puxa tudo isso?

Steinbruch: Basicamente crédito, renda e emprego. A partir do momento em que as pessoas contam com essas três coisas, elas partem para consumo naturalmente e é isso que vem segurando a estabilidade do Brasil.

Valor: Diante disso, como viu o aumento de 0,75% feito pelo Banco Central na taxa de juro?

Steinbruch: Desnecessário e inoportuno. Demonstra uma certa fraqueza do governo em não conseguir conviver com a nova realidade do país, de uma economia forte. Não precisava e não deveria ser feito. É uma defesa do medo. Considero que não foi uma decisão feliz.

Valor: O mercado brasileiro não estaria superaquecido, motivando essa decisão?

Steinbruch: Se for ver o preço que outros países estão pagando para fazer com que a economia desacelere, é absurdo uma decisão dessa. É completamente irracional. A taxa de inflação está dentro da faixa. Não corremos o risco de falta de produto no país. E a taxa de câmbio que temos hoje favorece a importação. O Brasil tem condições de produzir mais e conta com essa possibilidade de poder trazer produtos. O gargalo está em produtos de alto valor agregado, não em bens básicos.

Valor: Hoje, como está operando a CSN, empresa que você comanda?

Steinbruch: A CSN está operando à plena capacidade em alguns segmentos e em outros ainda não. Há alguns gargalos que estamos enfrentando e, com poucos investimentos, vai aumentar a produção em pouco tempo.

Valor: Se o BC fizer novas altas nos próximos meses da Selic, como se fala, isso poderá frear a expansão da economia do país?

Steinbruch: Não creio que freie, porém sinaliza a intervenção medrosa do governo. Ele deveria estar preocupado em trazer mais 60 milhões de novos consumidores à economia, de pessoas que estão fora da zona de consumo. Já trouxe 40 milhões das classes média e baixa e 20 milhões de assistidos e tem outro tanto para trazer. Não há porquê ter medo: o Brasil precisa produzir e consumir mais se almeja ser uma grande potência. Ao invés de subir o juro, baixá-lo. Conceder mais financiamentos, propiciar mais renda, mais emprego, trazendo mais gente para o mercado de consumo. Esse é grande mérito do presidente Lula, com 10 milhões que ele traga a mais, já seria muito gratificante.

Valor: Qual o plano de negócios para a CSN que você tem traçado hoje para os próximos cinco anos?

Steinbruch: A CSN optou por um crescimento horizontalizado, priorizando áreas novas de atuação. Temos aço, mineração, cimento, energia e infraestrutura e logística. Vamos elevar a produção de aços planos, com módulos de 1,5 milhão de toneladas, buscando nichos onde ainda não atuamos. É um plano bastante ousado, de um lado, mas conservador de outro. Em vez de sermos o maior de aço plano, preferimos estar entre os maiores, mas sempre procurando nichos de mercado onde podemos crescer. No segmento de longos, no qual ainda não temos nada, almejamos 20% do mercado. O mesmo em cimento. Na mineração, o projeto é um pouco diferente, porque é voltado para exportação. Vamos potencializar o volume máximo de produção da mina e de embarque no porto, de 130 milhões de toneladas. Em energia, vamos buscar oportunidades para investir, porque todo crescimento nosso terá de contar com geração própria.

Valor: A CSN vai participar da hidrelétrica de Belo Monte?

Steinbruch: Estamos estudando, com todo o cuidado que merece. Se for oportuno, estaremos lá. Como são 10% destinados a autoprodutores, vai depender também do interesse de outros. Provavelmente, uma presença compartilhada.

Valor: Quanto soma o programa de investimentos da empresa?

Steinbruch: São R$ 34 bilhões até 2016. Esse valor que acabou de ser aprovado pelo conselho.

Valor: Você concorda que mudou o foco da companhia, de aço para minério de ferro e cimento?

Steinbruch: Não. O foco da CSN é aquele que ela puder fazer para agregar valor ao seu acionista. O aço é tratado com prioridade, mas dentro daquilo que a CSN tem devemos explorar outras potencialidades da empresa. Mineração, cimento, logística e energia são áreas afins. Então, têm de ser tratadas da mesma forma.

Valor: Você estruturou os negócios em cinco áreas. Isso dá maior visibilidade ao valor de cada um?

Steinbruch: Foi para dar maior liberdade ao seu crescimento. As partes valem mais que o todo, é claro, mas, mais do que isso, queremos que haja mais flexibilidade para que cada área possa crescer conforme sua potencialidade.

Valor: Formatar uma grande mineradora de ferro é uma recriação da Vale, que você perdeu lá atrás?

Steinbruch: É algo que a CSN sempre teve e, em algum momento, teria de ser explorado. Nossa missão é tornar a CSN o mais forte possível com o que ela dispõe. Desde sua fundação, já veio com esses ativos [Casa de Pedra]. Se não foram explorados até agora, isso se deve a um erro de avaliação. O grande mérito está na sua criação, ao ser contemplada com os melhores ativos que há no Brasil. E temos a obrigação de potencializar o valor da companhia sempre.

Valor: Como está a abertura de capital (IPO) de Casa de Pedra, que estava prevista para este trimestre?

Steinbruch: Estamos bem adiantados, mas não é fácil, pois envolve várias alternativas de modelo e estruturas de negócios. Vamos olhar cada uma delas e optar pela melhor. Não vamos fazer a qualquer preço. Enquanto houver proposta boa para ser avaliada, vamos sentar e avaliar.

Valor: Já contratou bancos para realizar a operação?

Steinbruch: Há vários bancos trabalhando por conta e risco. Estão fazendo suas propostas em cima da proposta original de simples IPO que, graças a Deus, não foi feito, pois surgiram várias propostas muito melhores. Estamos também negociando com os sócios da Namisa [grupo de usinas de aço do Japão e Coreia do Sul] para se juntarem a um projeto único. Faz todo sentido, pois traz muitas sinergias para a Namisa, para a CSN, bem como para o IPO.

Valor: A data da operação ficou, pelo visto, para o segundo semestre.

Steinbruch: Na verdade, a data limite é julho. Antes das férias de verão da Europa e dos Estados Unidos. O processo é muito grande e bastante trabalhoso.

Valor: Quanto prevê levantar de dinheiro nessas operações de IPO?

Steinbruch: Não é a nossa preocupação maior. O que levantarmos será consequência do bom projeto que pudermos oferecer ao mercado. Sobre os outros setores, eventualmente pode haver uma aquisição, o que permitirá acelerar o processo. A própria siderúrgica também pode ser contemplada com IPO, com a união dos ativos de aço numa única empresa. Posso dizer que serão mais de um IPOs.

Valor: Você é muitas vezes comparado com o Eike Batista, dono da EBX, um empresário empreendedor, visionário, mas que é visto por muitos como especialista em vender sonhos na Bolsa. Você se incomoda?

Steinbruch: Não, pelo contrário. Não sou comparado, porque até agora não vendi nada de sonhos. Acho que se ele conseguiu fazer isso tem todo meu respeito e minha admiração. Acho ele um empresário ousado e, mais do que isso, que tem dado certo. O perfil de cada um é diferente, bem como os projetos. Infelizmente, eu não fiz o que ele fez.

Valor: Qual tua avaliação sobre o aumento de 100% para o minério de ferro neste ano?

Steinbruch: Na verdade, o mundo está pagando o preço necessário para a China continuar ampliando sua economia. Não passa só pelo minério de ferro. A China se tornou um grande comprador de matérias-primas e grãos e compra cada vez mais. E, por conta disso, o preço se ajusta pelas condições de mercado.

Valor: Qual será o peso do negócio de minério de ferro, daqui a cinco anos, na receita da CSN?

Steinbruch: Siderurgia e mineração vão crescer juntos, embora o projeto para 110 milhões de toneladas já esteja bem avançado, quase no meio. Mas a área de aço agora começa a crescer com os projetos de aços longos e as novas unidade de aços planos. Neste último caso, deveremos começar os projetos do Rio (Itaguaí) e Minas (Congonhas) em breve.

Valor: Qual tua avaliação do presidente Lula? Virtudes e defeitos.

Steinbruch: Acho que o presidente Lula foi uma surpresa muito agradável a todos. Conseguiu atender praticamente todos os brasileiros. O Brasil se favoreceu por igual de uma época positiva da economia mundial. O grande mérito foi trazer para o mercado de consumo 60 milhões de brasileiros, que, pela primeira vez, tiveram acesso a emprego, a crédito e a renda. E mostrou que a equação desses fatores é extremamente positiva. Acredito que, independentemente de corrente política e de gostar ou não gostar, o Brasil é uma nova realidade no mundo. Evoluímos muito do ponto de vista empresarial, em todos os setores: de financeiro a serviços.

Valor: O que espera do novo governante do país a partir de 2011?

Steinbruch: O presidente Lula deu um grande salto para o Brasil. O que esperamos do novo presidente é que dê as condições para o Brasil continuar crescendo e, mais do que isso, dar esse novo salto. Ainda não nos avaliamos de forma correta: o Brasil é muito melhor do que as pessoas pensam que é. Mas precisamos das reformas tributária, política, trabalhista e fiscal. Todas são necessárias.

Valor: Sobre as eleições para presidente da República neste ano…

Steinbruch: Acho que será uma eleição dura. Mas é um processo bom ao país e todas as condições positivas já estão implementadas.

(Ivo Ribeiro | Valor)
 

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