Em busca de um novo sócio para a Gerdau

A maior siderúrgica nacional pretende se tornar, também, uma das maiores mineradoras — para isso, precisa de ajuda

O que é melhor: extrair minério de ferro de uma montanha ou produzir aço? Pela lógica governamental que tenta reger o debate econômico brasileiro, parece não haver dúvidas de que o caminho para o desenvolvimento está no aço, um produto de “valor agregado”, e não na simples e primitiva extração de minério.

Em 2011, o governo federal conseguiu derrubar o presidente da maior empresa privada brasileira (a Vale) porque ele não gostava muito da ideia de construir siderúrgicas no Pará — Brasília queria enfiar o projeto goela abaixo dos milhares de acionistas da Vale, e enfiou.
 
Pois está em curso, atualmente, um movimento com potencial para deixar ainda mais claro tudo que esse debate tem de torto. A gaúcha Gerdau, maior siderúrgica nacional, cansou de depender do “valor agregado” do aço.
 
Segundo EXAME apurou, o banco de investimento americano Goldman Sachs começou neste ano, de maneira oficial, a procurar um sócio para o mais ousado projeto da história recente da Gerdau: a empresa, que já produzia minério para consumo próprio, pretende se transformar numa das maiores mineradoras do país.
 
O negócio deve custar ao novo sócio cerca de 2 bilhões de reais — o Goldman Sachs já procurou grandes mineradoras e empresas especializadas na venda de commodities e espera que as propostas iniciais sejam entregues nas próximas semanas.
 
Procurado, o presidente da empresa, André Gerdau, não quis dar entrevista — a companhia está em período de silêncio em razão da divulgação de seu resultado anual.
 
Ou seja, a Gerdau, que não deve satisfações ao governo e defende os interesses de seus acionistas da maneira que bem entende, decidiu que o melhor, hoje, é vender minério. Por quê? Para as empresas de siderurgia no Brasil, está ficando cada vez mais difícil ganhar dinheiro com a produção de aço.

 A situação começou a desandar em 2008, quando a crise internacional derrubou os preços do aço em cerca de 30%. Desde então, a coisa só piorou, e por um motivo um tanto bizarro.

O aço chinês atravessa o mundo e chega por aqui custando 20% menos do que o produto nacional — num exemplo eloquente de que a falta de competitividade que assola nosso tecido industrial é o real problema que deveria tirar o sono do governo.

Estima-se que o mercado mundial de siderurgia tenha um excesso de capacidade de 500 milhões de toneladas por ano: numa situação como essa, os custos de cada país fazem toda a diferença no resultado final das empresas. Segundo um estudo da consultoria Booz & Company, o Brasil poderia ser o terceiro país mais competitivo do mundo no setor.
 
Mas, em razão dos custos trabalhistas e tributários, estamos na sexta posição, atrás mesmo de países ricos, como Estados Unidos e Alemanha. Eis o corolário disso tudo: nos últimos três anos, o lucro da Gerdau caiu à metade — e, como o Brasil não vai se tornar competitivo do dia para a noite, a solução terá de vir de outro mercado.
 
Quem extrai minério de ferro, por sua vez, vive um momento totalmente diferente. De acordo com o banco Credit Suisse, há um déficit anual de mais de 90 milhões de toneladas graças em grande parte ao elevado apetite chinês. Enquanto o preço do aço subiu 154% na última década, a cotação do minério de ferro subiu 1 192%.
 
“Todo mundo está caçando minério”, afirma Pedro Galdi, analista da corretora SLW. “Salvo uma catástrofe na China, ele tem demanda garantida.” A ideia da Gerdau é vender 40% de seus ativos de mineração, avaliados em 4 bilhões de dólares — ou 130 vezes mais que o valor pago pelas minas em 2003.
 
Ao se lançar no negócio de mineração, a Gerdau tenta seguir os passos da CSN, que desde 2007 inclui em seu balanço os resultados da exportação de minério de ferro. Entre 2006 e 2011, a siderúrgica comandada por Benjamin Steinbruch manteve as margens líquidas da companhia praticamente estáveis, na casa dos 23%, as maiores do setor.
 
Na Gerdau, por outro lado, as margens caíram de 15% para 6% no mesmo período. Pelos planos da Gerdau, a companhia deve elevar a produção de suas minas no interior de Minas Gerais dos 7 milhões, previstos para 2012, para 25 milhões de toneladas por ano.

Estima-se que a nova atividade renda uma receita extra de aproximadamente 5 bilhões de reais por ano. Mais importante que isso, o lucro com a operação deve ultrapassar a casa do bilhão de reais, o que ajudaria a recuperar as deterioradas margens da Gerdau.

“Essa operação força o mercado a embutir no preço da ação da Gerdau os ativos de minério, o que não acontecia antes”, diz Claudio Pitchon, diretor responsável pela área de mineração e metais nas Américas do banco WestLB.
 
Com sócio, sem dívida 
 
Com um ativo tão valioso em mãos, por que a Gerdau ainda busca um sócio para a empreitada? A resposta está na diluição do risco de exploração. Estima-se que, para chegar ao nível de produção de minério planejado pela empresa, seja necessário investir 4,5 bilhões de dólares — ou quase duas vezes a geração de caixa da Gerdau.
 
“Sem um sócio, a empresa teria de se endividar pesadamente para dar conta desses investimentos”, diz Rafael Weber, analista da corretora Geração Futuro. “Além disso, qualquer atraso ou problema na mina poderia drenar os investimentos em outros projetos de siderurgia, que é, afinal, seu negócio principal.”
 
A estratégia é semelhante à utilizada pela CSN e pela Usiminas, que venderam participações em seus ativos de mineração em 2008 e 2010, respectivamente, para diminuir seus riscos. Em 2009, no auge da crise, a Gerdau teve de renegociar seus limites de endividamento com aproximadamente 40 instituições financeiras, o que acabou por encarecer os custos com a dívida em cerca de 60 milhões de reais.
 
Para evitar que isso aconteça novamente, a companhia captou quase 5 bilhões de reais em uma nova emissão de ações em abril do ano passado. A ideia é que esse dinheiro garanta o baixo nível de endividamento até que as minas da empresa comecem a exportar o minério excedente, algo que deve começar a acontecer em dois anos.
 
A mina só deve atingir a capacidade plena em 2017. Até lá, a Gerdau terá de se contentar com o aço — como se viu, um produto com problemas de alto valor agregado.

(Marianna Aragão | Exame)

 

 

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