Após dois anos de GP, Estácio vai retomar processo de expansão

Do alto do 6º andar de um prédio na Barra da Tijuca, no Rio, funciona uma das três maiores redes de ensino superior do país, a Estácio. Mas alguém desavisado poderia pensar que se trata de qualquer outro lugar. O cenário típico das salas de aula passa longe dali. Quadro branco e pincel atômico dão lugar a mesas de escritório, computadores e gráficos e mais gráficos com metas de gestão.

Hoje, diante desse novo cenário, Eduardo Alcalay, presidente da Estácio, considera que parte de sua missão, assumida dois anos e meio atrás, foi cumprida. As classes, espalhadas em 78 unidades em 16 Estados e até no Paraguai, ficam distante do escritório administrativo, de onde são comandadas compras, contratações, finanças, marketing e até os currículos das 2 mil disciplinas de toda a rede.

É uma realidade bem diferente daquela encontrada por Alcalay em 2008. Sócio da GP Investments desde 2005, o executivo se deparou com um gigantesco conglomerado de escolas cujas decisões eram tomadas de forma totalmente descentralizada. Da grade dos cursos à compra de papelaria, cada unidade tinha autonomia para comandar tudo.

"O mérito dos últimos 40 anos foi construir uma rede de ensino nacional. Depois, com a GP veio um freio de arrumação. Foi um passo para trás, para agora darmos dois para a frente", diz Alcalay, que só agora, com a casa em ordem, pretende tocar o projeto de expansão. Maior acionista individual da Estácio, com 19,4%, a tarefa da GP, ao menos inicial, foi outra: arrumar uma casa que começou a ser construída 40 anos atrás pela família Uchôa Cavalcanti em um imóvel no Rio e que se transformou em uma rede de ensino com 220 mil alunos, ligeiramente abaixo da concorrente Anhanguera, que tem 227 mil alunos.

A tarefa está sendo tocada por um inseparável trio de executivos: Alcalay, o presidente, Paula Caleffi, diretora de ensino, e Rogério Melzi, diretor de operações. Juntos, os três já visitaram 68 das 78 unidades da Estácio para explicar o novo modelo pedagógico e, é claro, de negócios. "A ideia é mostrar que não existe separação entre gestão e academia. Uma coisa depende da outra", diz Alcalay, que antes de ser sócio da GP trabalhou em banco, no UOLe chegou a montar sua própria butique de investimento.

Do lado da gestão, está Rogério Melzi, diretor de operações, com passagem pela Suzanoe pela Ambev. Apesar do jeito bonachão, Melzi causa certo temor todo fim de mês, quando as metas são cobradas. Internamente, os funcionários apelidaram o período de TPM: tensão pré-Melzi. A cobrança recai sobre quase todo o quadro executivo da Estácio. Nem os 8 mil professores escapam: os 20% que receberam melhores notas dos alunos e da coordenadoria acadêmico são premiados. Por outro lado, a recompensa vem para todos na forma de bônus, a tão conhecida política de meritocracia da GP.

De outro lado, com fala mansa e pausada, Paula, que trabalhava na Unisinos, do Rio Grande do Sul, cuida da unificação dos currículos. Das 22 aulas por semestre, 15 delas são padronizadas para criar unidade na qualidade de ensino.

Os cursos da Estácio também passaram por uma faxina. Aulas de gestão de negócios de surf e de Carnaval, deram lugar à criação de grades mais próximas da necessidade do mercado, logística e petróleo e gás. Mas isso implicou um custo para a Estácio, que precisou manter as faculdades até que os alunos se formassem.

Agora, passada essa fase de reestruturação, começa outro desafio para o trio: fazer a Estácio crescer. É o aumento do número de alunos que vai fazer a rede de ensino tirar proveito dessa arrumação. A estrutura de suporte às faculdades, segundo Alcalay, tem capacidade para receber o dobro de alunos que a escola tem hoje.

Depois de dois anos sob o comando da GP, a Estácio fez só uma pequena aquisição, a da Atual da Amazônia, com 4,5 mil alunos, por R$ 20 milhões. É um caminho diferente daquele seguido pelos fundos de "private equity" Pátria, na Anhanguera, e Advent, na Kroton. Diverge também daquele seguido por dois casos de sucesso que passaram pelo portfólio da própria GP: BR Mallse Hypermarcas.

Para Alcalay, a Estácio se aproxima mais da distribuidora e geradora de energia Equatorial, que também foi da GP e da qual ele foi conselheiro. Apesar de a Equatorial não ter feito nenhuma aquisição sob a gestão da GP – até porque questões societárias impediam isso – a reestruturação de três anos e meio trouxe aos cotistas do fundo um dos maiores retornos da história da gestora. Comprada por R$ 30 milhões em 2007, foi vendida três anos e meio depois por R$ 493 milhões ao fundo PCP. "A criação de valor na Estácio passa mais pela gestão, como na Equatorial", afirma o presidente.

Parte dessa transformação já está sendo captada pelos investidores. Quando a GP entrou na companhia, em maio de 2008, pagou R$ 261,2 milhões por 20% da Estácio. Hoje a fatia de 19,4% da GP vale R$ 427 milhões. Ainda é pouco para os padrões de retorno exigidos por investidores de fundos de "private equity", mas Alcalay diz que a GP ainda pretende ficar pelo menos mais três anos na companhia.

Nos resultados, o trabalho de gestão tem aparecido. A lucratividade sobe ano após ano, mesmo com pouca variação no faturamento. Mas analistas ouvidos pelo Valorainda cobram melhoras na margem operacional da Estácio, que estava em 13,1% nos nove primeiros meses de 2010 e em 16,8% no terceiro trimestre. Está abaixo, por exemplo, da margem Ebtida – relação entre a receita e lucro antes de juros, impostos, depreciação ou amortização – da Anhanguera, que foi de 24,1% nos nove primeiros meses de 2010.(Ver números acima)"É como se a máquina estivesse pronta agora para começar a produzir mais", diz um analista.

O fato de a família fundadora da Estácio ter reduzido sua participação de 52,2% para 10,5% em uma oferta de ações de R$ 686 milhões em outubro também é visto por alguns investidores como um ponto que pode acelerar a vinda de mais resultados.

Isso, porém virá principalmente do crescimento. Duas unidades serão abertas em São Paulo neste ano. A maior delas, no Morumbi, com 12 mil alunos. Ao mesmo tempo, a Estácio quer voltar às compras, principalmente em São Paulo, Minas e nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Hoje cerca de metade de seus alunos está no Rio, território onde em dezembro a Anhanguera, mais forte no interior de São Paulo, anunciou sua entrada com a aquisição do Centro Universitário Plínio Leite.

Para tocar esse projetos, a Estácio tem R$ 184 milhões em caixa e pegou em dezembro outros US$ 30 milhões em um empréstimo por dez anos com o International Finance Corporation (IFC), braço de financiamento privado do Banco Mundial.

(Carolina Mandl | Valor)

 

 

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