(Por Carolina Spillari em entrevista com a vice-presidente da Apsis, Ana Cristina França)
Valor justo é método contábil “pé no chão”
Após a crise de 2008, as regras internacionais de contabilidade ganharam força entre as companhias, em especial sobre o modo de mensuração de seus ativos. Um desses métodos de mensuração é o valor justo, que avalia o ativo não só pelo que foi pago por ele (custo contábil). Pelo valor justo, a companhia vai a mercado saber quanto aquele ativo valeria se fosse vendido hoje (na data de mensuração). Nas empresas, a avaliação dos ativos pode impulsionar a marca.
Antes da crise, as regras para mensuração dos ativos das empresas eram esparsas, e não havia uma unificação. Pensando em trazer os conceitos de valor justo para o Brasil, Ana Cristina França de Souza, vice-presidente da Apsis Consultoria, trouxe para o País a obra “Wiley Guide to Fair Value Under IFRS”, de James P. Catty, lançado há menos de um mês em São Paulo e no Rio.
No guia sobre valor justo, Ana Cristina e outros integrantes da Apsis participaram da revisão técnica e elaboração do capítulo “Aplicação do Valor Justo no Brasil”. “Com a introdução do valor justo na contabilidade em 2008, passou a ser um assunto muito importante”, justifica.
Na publicação é possível encontrar exemplos práticos como ativos intangíveis, derivativos, instrumentos financeiros, ativo imobilizado e propriedade intelectual em 37 capítulos de autores de diversos países.
Cristina explica que a grande mudança ocorreu com a conversão das práticas do padrão US Gaap com o padrão IFRS em 2012. Porém, “na prática é difícil mudar as regras”, diz. Com o IFRS 13, a definição de valor justo no mundo foi unificada.
O documento criou os níveis hierárquicos para a metodologia de apuração. A partir dos níveis 1, 2 ou 3 é possível mensurar o ativo a partir de dados mais reais e com menor subjetividade (nível 1) até dados mais subjetivos, que demandam simulação de cenário (nível 3).
Segundo Cristina, “antes a contabilidade era muito focada no custo, hoje migrou para a recuperabilidade”. Isso que a melhor avaliação que uma empresa pode fazer de um ativo é quanto de seu custo ainda pode ser recuperado – esse acaba se tornado seu valor justo. O que vai valer será o custo em relação ao mercado. Passa a importar se a empresa “vai conseguir realizar o valor. Não interessa só o que pagou”, explica a vice-presidente da Apsis.
Essa nova ideia de valor ganhou importância após a crise de 1998. “Os investimentos deixam de ser valorizados pelo custo de aquisição, e passam a ser avaliados pelo quanto possam valer no mercado”, destaca. Com isso, as empresas deixam de ter uma “contabilidade inchada” e passam a ter outra mais “pé no chão”.
Para Cristina, o Brasil conseguiu aderir às práticas contábeis internacionais com bastante velocidade, mas ainda tem muita coisa a ser feita. “Muitas empresas adotaram, mas é difícil mudar a política contábil. É preciso haver treinamento interno e das próprias contabilidades das empresas.”
Nesse cenário e diante das novas tecnologias e mídias como a internet e redes sociais, surgem novos métodos de avaliação. As marcas e os softwares, integrantes do que em contabilidade se chamam ativos intangíveis, vêm cada vez mais ganhando espaço e valor no mercado. Exemplos notáveis são o Facebook e a Apple. Cristina pergunta: “Na Apple o que tem mais valor a marca ou o software?”.
Resta às empresas fazerem uma gestão de valor. Essa gestão de valor cabe a ativos intangíveis ou instrumentos financeiros e demanda a mensuração pelo valor justo de ativos. Na Apsis, há uma equipe especializada em identificação e levantar o valor de bens de uma empresa há pelo menos 15 anos.
Operadoras de telefonia como a Oi precisam fazer um levantamento de seus ativos e ter um controle físico, de seus ativos tangíveis, para atender às exigências das agências reguladoras, assim como as distribuidoras de energia. “Muitas das regras para gestão do ativo tangível podem ser usadas de forma estratégica para ativos intangíveis”, esclarece. No Brasil, a adaptação da IFRS 13 está no CPC 46.
Cristina prepara para o final do ano que vem uma obra específica voltada aos ativos intangíveis. A primeira dificuldade desses ativos é a identificação. “As marcas surgiram com o brasão nos tempos medievais”, lembra. Nas empresas, constituem ativos intangíveis sua carteira de clientes e tecnologia. “Tangibilizar é um processo cultural dentro de uma empresa”, reconhece.
Esse processo depende da qualidade da informação, a origem dos clientes e o relacionamento que a empresa tem com eles. Com o Facebook e Instagram, que dão acesso ao que as pessoas está fazendo o tempo todo, essa relações ganham novo reconhecimento e valor. “Alguns ramos de comércio estão se dando apenas pelo ecommerce”, ilustra.
Se uma empresa souber avaliar os ativos intangíveis, irá saber se posicionar melhor no mercado. “Uma avaliação estratégica da empresa hoje irá implicar em seu valor no futuro.”
Fonte: Executivos Financeiros