Mercado livre triplica e atrai negócios

Comercializadoras e plataformas de negociação que atuam no mercado livre de energia aumentam investimentos para ganhar espaço em um negócio que atualmente movimenta R$ 25 bilhões anualmente. Eles apostam que esse volume vai triplicar para R$ 75 bilhões em meia década.
 
As oportunidades estão no Ambiente de Contratação Livre (ACL), por onde passam mais de 10 mil gigawatts (GW) médios por ano, girando R$ 25 bilhões em contratos de curto, médio e longo prazos. "Esse mercado pode dobrar sem mudança de regras", diz o presidente da Comerc Energia, Cristopher Alexandre Vlavianos, sócio de uma das quatro maiores comercializadoras do País.

O empresário aponta que o número de consumidores chamados especiais, que contratam entre 0,5 megawatt (MW) médios e 3 MW médios, autorizados por regulamentação a acessar o mercado livre, representam um consumo de 24 mil MW. Mas apenas metade dessa demanda é contratada no mercado livre.
 
O presidente da Comerc diz que cresce hoje de maneira orgânica apenas com a atração desses consumidores. O número de unidades atendidas pela Comerc passou de 194 no fim de 2011 para 260 hoje, salto de 80,4%. Para fazer frente à maior clientela, a Comerc contratou 16 pessoas esse ano, incrementando o time em 35,4%. Outros cinco vão ser contratadas nesse semestre.
 
A migração de empresas – que passaram décadas comprando energia sempre do mesmo fornecedor a um preço dado pela oferta e sem qualquer possibilidade de gestão – para o mercado em que prazos e preços são resultados de negociações está crescendo. O que era zero em 2003 hoje é um universo de mil grupos empresariais.
 
Metade deles consome mais de 3 MW médios e já fizeram essa transição. Mas a outra metade é de unidades que consomem menos de 3 MW, das quais 50% ainda farão essa passagem.
 
Hoje, o mercado livre representa 25% de toda energia produzida no país. A Comerc projeta que esse segmento chegue a 40% em meia década. A empresa fechou 2011 com R$ 542 milhões de faturamento e não descarta atingir o patamar de R$ 1 bilhão de receita bruta em 2012, sendo uma parte gerada pela área de gestão – a firma administra 3,3 GW de potência de geração – e uma parte na mesa de negociação (trading).
 
Mesmo grandes corporações industriais, como a Marfrig, ainda trocam o cativo pelo livre. O grupo planeja que 90% dos 40 complexos industriais no Brasil, divisões Seara e Bovinos, passem a consumir energia elétrica via mercado livre. Hoje, dos 120 MWh médios consumidos pelas unidades da holding, 65% são contratados do mercado livre e 35% do mercado cativo. O diretor de sustentabilidade do grupo Marfrig, Clever Pirola Ávila aponta que busca economia de custos e cuidados com políticas ambientais para justificar essa estratégia.
 
A entrada de novos consumidores é apenas um dos vetores que estão puxando o crescimento desse mercado. O outro catalisador é a própria liquidez financeira dos negócios, o chamado aumento do efeito multiplicador.
 
No Brasil, para cada unidade de energia produzida e comercializada no mercado livre há a movimentação de 2,5 unidades monetárias. Na Europa, essa relação é de 1 para 7, aponta Marcelo Mello, presidente da plataforma Brix, controlada pela ICE Intercontinental Exchange e pelos empresários Eike Batista, Marcelo Parodi e Josué Gomes da Silva.
 
Lançada ano passado, a empresa quer se transformar em bolsa em cinco anos. Hoje, oferece uma plataforma de negociação com serviços e contratos usados por 220 agentes do mercado que movimentam uma média e 850 MW médios mensais.
 
"Vamos dobrar o número de agentes esse ano", diz o presidente da Brix, Marcelo Mello. "E já negociamos com bancos possibilidades de termos contratos com liquidação financeira", adiantou.
 
A Brix mantém reuniões técnicas com a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para a estruturação de contratos financeiros. Espera ter o sinal verde do órgão regulador até o fim desse ano. Enquanto isso, vai negociando com instituições financeiras.
 
Mas os bancos já perceberam esse potencial, antes mesmo do surgimento do primeiro contrato. Em setembro do ano passado, o BTG Pactual assinou acordo para aquisição de 100% da Coomex, uma das maiores comercializadoras independentes do Brasil, com faturamento anual de cerca de R$ 500 milhões. Em novembro foi a vez da Equatorial Energia comprar as ações da Sol Energias Comercializadora para deter, indiretamente, 51% do capital votante. E em fevereiro passado, o Pátria Investimentos assumiu 50 por cento da Capitale.
 
Esse segmento também atrai o interesse de grandes companhias de energia, que atuam no ambiente livre e cativo. A Enertrade, por exemplo, é a comercializadora ligada ao grupo português EDP. Usa esse braço para agregar valor à carteira de clientes. E estima um crescimento da receita e do volume de negócios da ordem de 25% esse ano com a maior demanda de consumidores que estão migrando do mercado cativo para o mercado livre.
 
Em 2011, a empresa movimentou 1,2 GW médios. "O percentual de participantes nesse mercado livre vai crescer na medida em que tivermos ajustes como por exemplo, a possibilidade de revenda de energia excedente", aponta o diretor da Enertrade, João Carlos Guimarães.
 
É de olho nos negócios também de curto prazo, o spot, que o Balcão Brasileiro de Comercialização de Energia (BBCE) está investindo R$ 12 milhões para se transformar "no melhor ambiente para se negociar energia no Brasil", nas palavras do presidente do grupo, Flávio Cotollessa. "Queremos 75% do mercado spot no Brasil", disse.
 
A BBCE, que reúne 13 comercializadoras sócias, em que cada uma entrou com uma cota de R$ 200 mil, planeja que outras 47 cotas sejam vendidas até meados do ano que vem, formando o funding principal do projeto. A BBCE planeja lançar até o fim de junho um homebroker para atender pequenos agentes do setor que ainda não podem acessar o mercado livre diretamente.
 
Apesar da concorrência, há agentes que acreditam na convivência de duas bolsas. "Essas duas tem grande espaço para crescer. Já é possível ver uma certa aderência entre preços e volume de negócios", diz o diretor de gestão de energia e comercialização da AES Brasil, Ricardo Cyrino.

(João José Oliveira | Valor)
 

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