Imóveis em cota

O boom imobiliário extrapolou para o universo dos investimentos financeiros ligados ao setor. Uma das alternativas mais eficientes para pegar carona no crescimento desse mercado, os fundos imobiliários dobraram de tamanho no último ano e meio, alcançando um patrimônio líquido de R$ 9,9 bilhões no fim de junho, distribuídos entre 114 carteiras. Listados em bolsa, há pouco mais de 50 portfólios do tipo – nos quais se concentram os aplicadores pessoa física – com valor de mercado superior a R$ 9 bilhões, praticamente o dobro do registrado um ano atrás.

Tamanha expansão está calcada no forte apetite do investidor, atraído pela combinação de retornos superiores aos da renda fixa com o baixo risco associado aos imóveis. A principal vantagem dos fundos em relação ao ativo real, no entanto, está no benefício fiscal. Desde que a carteira seja listada em bolsa e tenha pelo menos 50 cotistas, o rendimento distribuído mensalmente ao investidor individual na forma de dividendos é isento de Imposto de Renda (IR).

Para quem prefere comprar o imóvel diretamente, a receita obtida com os aluguéis é tributada segundo a tabela progressiva de IR para pessoa física, cuja alíquota pode ir a 27,5%.

No mercado de bolsa (secundário), a maioria dos fundos tem feito jus á popularidade do setor. É o que mostra um levantamento da consultoria Fundo Imobiliário com os 38 portfólios mais transacionados. Segundo o estudo, com exceção de duas carteiras imobiliárias, todas as demais têm cotas negociadas com ágio, revelando que o investidor está disposto a pagar mais para entrar no mercado, mesmo que isso signifique abrir mão de parte da remuneração mensal (quanto maior o valor da cota, menor o rendimento percentual). Em maio, o dividendo médio do setor estava em 0,74%, levando em conta o preço no fim do mês. Para os que entraram nas ofertas primárias, o rendimento era de 1,16%, em média.

Em geral, quem busca o fundo imobiliário está de olho na renda. Tanto que os portfólios dedicados a empreendimentos já concluídos e com bons inquilinos para explorar o aluguel representam mais de 80% do mercado. De acordo com os dados da consultoria, o desempenho dos fundos imobiliários tem sido atraente, sobretudo se considerado o resultado global, que soma a distribuição de rendimentos à variação das cotas na bolsa. Nos últimos 12 meses até maio, a rentabilidade média do segmento superou 23%, ante 10% do CDI e 2,5% do principal índice da bolsa (ibovespa). No topo do ranking, o ganho beirou 60%. Já neste ano, nos cinco primeiros meses, o retorno  médio foi de 4,1%. Entre as carteiras mais rentáveis, a performance alcançou o patamar de 20%.

No período, o CDI bruto variou 4,5% e a bolsa caiu 6,7%. Mas como o retorno passado não garante nada, há dúvidas sobre o futuro. Assim como a alta abrupta de preços dos imóveis acendeu a luz amarela no setor, o investidor começa a questionar se há espaço para mais valorização dos fundos imobiliários.

Conforme mostrou uma análise recente da credit Suisse Hedging-Griffo (CSHG), o valor de mercado das cotas tem forte correlação com os dividendos. Ao analisar as carteiras com distribuição regular no período compreendido entre 2009 e abril de 2011, a gestora concluiu que, em 92% dos casos, o preço das cotas é dado pelos rendimentos. Isso significa que o futuro dos fundos imobiliários vai depender da atratividade da renda oferecida e, portanto, da qualidade e do potencial dos ativos em carteira.

Com 23 anos, o estudante de economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Henrique Carvalho é um investidor entusiasta dos fundos imobiliários. Depois de ganhar cerca de 30% direcionando 20% de seus recursos para a modalidade, ele avalia que é hora de embolsar parte do lucro. “Fiz isso porque a maioria dos produtos subiu muito. Há carteiras com 50% de rendimento em um ano.” explica. Para Carvalho, o segmento não está supervalorizado como o mercado tradicional de imóveis, mas ligeiramente caro para o atual momento de juro em alta e bolsa nas mínimas. Com base em estudos que comprovam que a evolução da cota está relacionada com os dividendos pagos, ele desenvolveu uma metodologia que parte da análise dos rendimentos em um período de 12 meses, calculando a média do período. Depois disso, divide o resultado pela cota  atual, a fim de chegar no retorno percentual com os dividendos mensais.

A partir daí, sugere comparar esse rendimento com o retorno de um ativo considerado livre de risco, como um título público, por exemplo, líquido de imposto de renda. “Na teoria, o fundo imobiliário precisaria pagar mais que isso para valer a pena.” Conservador, Carvalho ainda acrescenta um prêmio pelo risco da aplicação que ele definiu em 10% em um ano. Ao comparar os resultados com os dividendos distribuídos pelos fundos em maio, Carvalho concluiu que só três carteiras tinham potecial de valorização: uma focada em desenvolvimento imobiliário, e outras duas lastreadas em títulos do setor.
Em sua amostra, um dos poucos fundos imobliários em destaque foi o RB Capital Prime Realty I, especializado em desenvolvimento. Ainda incipientes no mercado, tais carteiras participam de todas as fases do projeto, da construção à venda, e por isso têm chances de entregar retornos mais expressivos.

Os outros dois fundos com potencial de ganho, segundo a análise, foram Excellence e o  CSHG Recebíveis Imobiliários. Ambos investem em papéis como os Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs)  e as Letras de Crédito Imobiliário (LCIs).

Diferentemente dos fundos “puros” de imóveis – cujo retorno depende de variáveis como preço de aquisição, futuro do empreendimento, fluxo dos aluguéis, oferta e demanda das cotas no mercado secundário, as carteiras de recebíveis do setor têm perfil de renda fixa. Seus rendimentos são suportados por títulos de dívida lastreados em contratos  de crédito imobiliário, que têm pagamentos predefinidos de juros e principal. Dessa forma, são menos voláteis. Isso vale também para quem compra esses papéis diretamente. A diferença é que o valor mínimo de investimento é maior, em geral acima de R$ 300 mil.

De investidor para investidor

Para quem gosta da ideia de aplicar em fundos imobiliários, o estudante de economia e investidor Henrique Carvalho tem algumas dicas para aumentar as chances de acerto. São cinco os principais passos que, na visão dele, merecem atenção. Vale destacar que, como todo investimento, não há garantia de retorno.

1 – Investir apenas no mercado secundário. O raciocínio é que os fundos listados em bolsa já contam com o histórico de rendimentos e liquidez, fatores essenciais para o sucesso da aplicação. Ofertas primárias, ao contrário, são uma surpresa.

2 – Optar por carteiras que registram mais de cem negócios por mês.

3 – Prestar atenção também ao volume de negócios, a fim de saber se ele é compatível com o investimento. Se o investidor aplicar R$ 100 mil em um fundo, ele precisa saber se, caso necessite de capital, vai conseguir sair do mercado rapidamente.

4 – Olhar a rentabilidade, medida pela variação das cotas e rendimentos distribuídos, dos últimos 12 meses. Com base na teoria de “regressão à média”, o argumento é o que os fundos que subiram muito em um ano tendem a perder o fôlego.

5 – Avaliar a tendência de distribuição de rendimentos também pode dar pistas sobre o desempenho futuro do fundo. No momento do investimento, os dividendos devem ser calculados com base no último valor da cota, a fim de ter um número mais próximo da realidade.

Especialista recomenda não alocar em fundos imobiliários mais que 20% do patrimônio

“O risco de quem investe em recebíveis imobiliários, mesmo que via fundo, tende a ser menor, por conta da previsibilidade de renda”, afirma o sócio da TRX Realty, José Alves Neto. “Esses títulos, no entanto, não captam a posibilidade de valorização dos ativos imobiliários, de tirar proveito do mercado aquecido.”

Na prática, porém, o investidor nem sempre tem essa percepção, e acaba alimentando a alta dessas carteiras apesar da perspectiva de rendimento estável. Em entrevista recente ao Valor, o superintendente-executivo da Bradesco Asset Management (Bram), Ricardo Mizukawa, disse que tal visão, equivocada, faz com que alguns fundos imobiliários de recebíveis possam estar supervalorizados. O diretor da Brazilian Mortgages, Vitor Bidetti, usa raciocínio equivalente para reforçar a tese de que é preciso considerar o potencial dos ativos em carteira ao avaliar um fundo de imóveis, e não apenas o fluxo dos rendimentos distribuídos. “Mesmo que os fundos imobiliários estejam pagando menos que o CDI líquido do IR, eles sempre trazem a oportunidade de ganho de capital com o aumento de receita dos aluguéis e valorização dos ativos.” Para Bidetti, a alta recente dos juros é um movimento pontual, e o investidor que busca diversificação precisa olhar o médio e longo prazos quando se espera uma reversão dessa tendência. Vale lembrar que os aluguéis são corrigidos anualmente pela inflação, o que preserva o valor real da receita. E em uma economia aquecida como agora, com escassez de ofertas de imóveis, os aluguéis têm sofrido reajustes relevantes nas renovações de contrato, acima dos índices de preços.

O inverso também é válido. João Mansur, sócio da Tag Properties, defende que os fundos imobiliários (especialmente os que compram o ativo real, e não papéis do setor) sejam encarados como um investimento variável, que pode ter seu rendimento reduzido em função de desaceleração econômica, vacância e índices de preço negativos, como já aconteceu com o IGP-M.
Por conta disso, são recomendados para quem mira o longo prazo.

Na gestora Rio Bravo, a gerente de investimentos imobiliários, Anita Spichler, diz que ainda há espaço para explorar o segmento comercial, mas lembra que é importante analisar alguns pontos: perfil dos locatários dos imóveis, localização do empreendimento, taxa de vacância na região e, no caso de shopping centers, qual o público frequentador. Ainda que observadas todas as condições, dizem os especialistas, é preciso ter cuidado com o nível de exposição a uma modalidade de investimento pouco líquida. Mansur, da Tag, sugere que esse patamar não supere 20% do patrimônio. Umas das estratégias para minimizar o risco, aponta, é buscar carteiras com pulverização de ativos ou créditos, a fim de garantir um retorno estável. No caso de fundos com um único ativo, o ideal é que haja então uma diversificação dos inquilinos. Mas para quem não quer fazer o trabalho de seleção sozinho e está estreando no segmento, a melhor opção, segundo o executivo, são os fundos de fundos imobiliários, apesar de ainda incipientes no mercado. Nesse caso, o investidor transfere para o gestor, em tese um profissional qualificado, a responsabilidade de buscar as oportunidades no mercado.

(Alessandra Bellotto l Revista ValorInveste)

 

 

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