PAULO CALMON VILLAS BOAS
Segundo o IBGE, mais de 90% das empresas brasileiras são familiares, o que significa que o comando já foi ou será transferido para um sucessor. Com os avanços econômicos e institucionais observados no mercado nos últimos 20 anos, tornou-se fundamental que as empresas familiares geridas pelo fundador planejem a sucessão. Nesse cenário, a família empresária tem como principal desafio alinhar os interesses a fim de garantir a longevidade do negócio. Esta iniciativa traz à tona a importância da implementação das práticas de governança corporativa, sobretudo com o objetivo de minimizar riscos de conflitos com as gerações seguintes, evitando assim perdas de valor que podem comprometer o legado de uma trajetória bem-sucedida de empreendedorismo.
Contudo, pesquisas mostram que no Brasil apenas 34% das empreasas contam com um plano de sucessão definido. Prova disso é que, de cada 100 empresas brasileiras familiares, apenas 30 chegam à segunda geração, e 15 à terceira. Estes números também indicam que a transição entre a primeira e a segunda geração é a mais crítica no processo sucessório. Na maior parte dos processos de sucessão, os familiares da segunda geração são os catalizadores para a implantação das primeiras práticas de governança corporativa. Caberá a estes membros a árdua missão de convencer o fundador a aceitar a profissionalização da gestão por meio de iniciativas de governança apropriadas.
Por definição, a governança corporativa está diretamente ligada às práticas de gestão que conectam os stakeholders da empresa – acionistas, gestores, clientes, fornecedores, bancos, funcionários e governo, entre outros. O objetivo é utilizar diversos mecanismos e arranjos organizacionais para obter melhorias de gestão, facilitar acesso a recursos fianaceiros e não financeiros(atração e retenção de talentos), preservar e otimizar seu valor, assim como avaliar de forma permanente seu propósito. No entanto, as primeiras ações de governança em empresas familiares requerem bastante empenho e perseverança dos membros da segunda geração para que estes demonstrem com clareza ao fundador seus benefícios. São exemplos de tais medidas: dissociar as despesas da família das despesas da empresa, eliminar a informalidade remanescente, criar controles financeiros mais fiéis à contabilidade, discutir a contratação de auditoria externa e, até mesmo, a contratação de um conselho consultivo independente.
Em muitos casos esta iniciativa não é suficiente para mudar as práticas do fundador, nem sequer para que se inicie a adoção de procedimentos mais elementares para a sobrevivência da empresa. Tal fato pode levar à perda de competitividade e, sobretudo, de valor econômico, tornando o negócio vulnerável a movimentos de consolidação setorial ou, eventualmente, tornando-o alvo de aquisição.
Estudos recentes revelaram que quando empresas familiares são avaliadas em processos de fusões e aquisições, seus múltiplos de valor (valor da empresa dividido pelo seu EBITDA) oscilam significativamente em razão do grau de maturidade de governança corporativa. No geral, empresas com um nível de governança mais maduro podem ser avaliadas por um múltiplo de EBITDA cerca de 50% maior do que companhias sem nenhuma governança. Diante de tantos benefícios, seja para perpetuar o negócio na família empresaria ou um eventual processo de fusões e aquisições, por que não investir na implantação das suas práticas?
Jornal do Commercio • Quinta-feira, 20 de agosto de 2015