Debênture atrai banco estrangeiro

Até agora celeiro dos bancos nacionais, a estruturação de dívida de empresas em reais por meio de debêntures, notas promissórias e recebíveis começa a entrar no radar das instituições estrangeiras. Goldman Sachs, J.P. Morgan e Barclays Capital estão montando equipes para comandar a emissão desses papéis, abrindo concorrência com Itaú BBA, BTG Pactual e Bradesco BBI, bancos responsáveis pela venda de 70% dos títulos de renda fixa no Brasil.

Os estrangeiros estão de olho em um mercado que movimentou R$ 88 bilhões em papéis no ano passado. São cifras que devem engordar nos próximos anos diante dos incentivos dados aos investidores pelo governo federal no fim do ano passado. Entre essas medidas, a que mais agrada os bancos de fora é a isenção de Imposto de Renda para aplicadores estrangeiros, que hoje praticamente não compram papéis de dívida de empresas emitidos no Brasil. Para títulos públicos, o imposto já não existe. Além disso, a perspectiva de queda da taxa de juros no Brasil no médio e longo prazos pode dar gás ao segmento de dívida privada, incentivando mais empresas a tomar recursos no mercado de capitais.

O Barclays trouxe de Londres o executivo Luciano Suana para desenvolver a área de negociação de debêntures, já que a liquidez é um quesito bastante demandado por investidores estrangeiros. Por enquanto, a compra e a venda dos papéis estão sendo feitas com recursos do próprio banco. O banco, entretanto, já conversa com aplicadores internacionais para trazê-los ao país. Além do mercado secundário, a instituição também avalia coordenar as ofertas públicas de papéis de dívida para as empresas.

Já o J.P. Morgan contratou Ricardo Leoni, que trabalhava na área de renda fixa do Santander. Procurado pela reportagem, o banco informou que não tinha porta-voz ontem para comentar o assunto.

O que limita a atuação dos bancos estrangeiros nas emissões de debêntures é o fato de essas ofertas exigirem garantia firme dos bancos. Ou seja, se não há demanda suficiente dos investidores, o próprio banco se compromete a comprar os papéis. Isso requer um balanço mais robusto das instituições, algo que os bancos estrangeiros não têm no Brasil. A expectativa é que, com a vinda de mais investidores para o país, as instituições não tenham que comprar os títulos. Na venda de ações, a disputa entre bancos nacionais e estrangeiros já é mais acirrada.

Um teste para a capacidade de distribuição dos estrangeiros será a oferta de R$ 300 milhões em debêntures do frigorífico Minerva, que tem o Goldman Sachs como coordenador líder. Será a primeira operação local realizada pelo banco, que reforçou o escritório de São Paulo com as contratações de Rodolfo Soares, que passou por BankBoston e Credit Suisse e estava no Safra Banco de Investimento, e Marcelo Bernal, que veio do HSBC.
A entrada do Goldman no mercado doméstico de dívida é consequência do relacionamento conquistado com os emissores durante processos de captação externa, segundo Richard McNeil, chefe da área de renda fixa para América Latina do Goldman. É o caso do Minerva, com quem o banco já havia realizado uma emissão externa no ano passado.

McNeil evitou relacionar a iniciativa do banco à decisão do governo de isentar de imposto de renda para estrangeiros. Ele afirmou, porém, que o interesse do investidor externo em aumentar a exposição a ativos brasileiros cresceu bastante após a crise.

Além da presença do Goldman como líder, a emissão do Minerva chama a atenção do mercado por resgatar o processo de emissão de debêntures conversíveis em ações, que nos últimos anos vinham sendo usadas apenas em colocações privadas. A maior parte dos recursos captados pelo frigorífico será usada para quitar uma Cédula de Crédito Bancário (CCB) emitida para o Banco do Brasil, que também participa da operação.

A emissão, que conta ainda com o Deutsche Bank entre os coordenadores, seguirá a prática local e será realizada com garantia firme, ou seja, os bancos terão de encarteirar os papéis caso não haja demanda dos investidores.
Apesar do interesse em reforçar a área de renda fixa, os bancos estrangeiros podem ter dificuldade para tirar profissionais das instituições líderes de mercado. Após a crise financeira, que teve como consequência o aumento da fiscalização sobre o setor e a restrição às políticas de remuneração variável, são os bancos brasileiros que têm aproveitado para buscar talentos na concorrência.

(Carolina Mandl e Vinícius Pinheiro l Valor)

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