Petrobrás: o difícil equilíbrio entre governo e mercado

Pressionada pelas regras de uma empresa de capital aberto, Graça desagradou a Dilma.

A dificuldade do governo de considerar as obrigações de uma empresa de capital aberto como a Petrobras contribuiu para a saída de Graça Foster e sua diretoria. Graça vinha se equilibrando entre o papel de executiva respeitada e o de indicada política à frente de uma empresa que tem acionistas privados e é controlada pela União. Enquanto protegia os interesses do governo, ela e seus diretores tinham que cumprir as obrigações de transparência e correção estabelecidas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Também estava sujeita às regras internacionais. Além da Bolsa de São Paulo (Bovespa), a Petrobras tem ações na Bolsa de Nova York (EUA) e em outros países. A estatal é investigada pela Securities and Exchange Commission (SEC), a CVM americana, e pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos.

Na última reunião do Conselho de Administração, em janeiro, Graça teve um embate com os conselheiros indicados pelo governo, liderados pelo ex-ministro Guido Mantega, sobre a publicação no balanço das estimativas de R$ 88 bilhões em perdas por corrupção e ineficiência. A executiva argumentou que, diante do número apresentado por consultores externos ao Conselho, era obrigação da empresa divulgar ao mercado. Graça foi apoiada pelos outros diretores, especialmente Almir Barbassa, o diretor de Finanças e Relações com os Investidores, que responde legalmente pelas obrigações de informação. Segundo uma fonte presente, diante da resistência, Graça chegou a dizer aos colegas que “chegou a nossa hora”, indicando a chance de renúncia coletiva.

O número saiu, mas desagradou a Dilma ao dar um tamanho para a corrupção na estatal que pode ser superestimado. Até mesmo técnicos da Petrobras avaliam que Graça foi precipitada ao divulgar um dado que ainda seria parte da apuração de perdas.

— O que uma empresa faz para calcular perdas é um teste relacionando os fluxos de caixa e os custos para chegar ao valor justo dos ativos, mas não é um número definitivo. Uma 2ª etapa é calcular o valor em uso, que mostra a capacidade de a empresa recuperar as perdas. Isso é o que mais interessa ao investidor — diz Luiz Paulo Silveira, vicepresidente técnico da consultoria Apsis, sem analisar o caso específico da Petrobras.

Também falando em tese, Marta Viegas, conselheira do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), explica que é obrigação das empresas abertas divulgar as informações que possam influenciar a cotação das ações ou a decisão dos investidores de exercer qualquer direito sobre os títulos. É o caso da substituição da diretoria.

— Transparência é mais do que informar o obrigatório. O que é relevante para o investidor vai variar de uma empresa para outra — afirma Marta, para quem ainda é preciso melhorar a cultura de governança nas empresas abertas de controle estatal. — Quando o governo controla uma empresa aberta, tem as mesmas responsabilidades de outros acionistas controladores. Está sujeito às mesmas regras.

Os executivos ficam no cargo até que substitutos assumam, mas, legalmente, a renúncia dos diretores tem efeito imediato, explicam advogados. Nem o fato de o balanço estar em aberto sem auditoria externa impede que eles deixem a companhia, nem mesmo o diretor de Finanças. A renúncia, contudo, não os exime de responsabilidades relativas ao balanço pendente, mas a tarefa de apresentá-lo é agora dos novos executivos.

(Alexandre Rodrigues e Glauce Cavalcanti | O Globo)

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